Os "Landmarks"in"A Maçonaria em Portugal", A.H. de Oliveira Marques, nº 6 da Colecção Cadernos Democráticos da Fundação Mário Soares, Ed. Gradiva, 1998. |
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São os princípios imutáveis aceites pelas Obediências de tipo anglo-saxónico como bases estruturais de toda a Maçonaria. Estes landmarks, cuja origem se deve, provavelmente, a influência bíblica (Deut., XIX, 14: "não tomarás nem mudarás os limites do teu próximo que os antigos estabeleceram na tua propriedade (...); Prov., XXII, 28: "não transgredirás os antigos limites que puseram os teus pais"), nunca conheceram compilação unanimemente aceite e autorizada, que pudesse funcionar como "declaração de princípios" da Maçonaria. As duas compilações mais célebres e citadas são a do norte-americano Albert Mackey (1856) e a da Grande Loja Unida de Inglaterra (1929), que indicam os landmarks seguintes: |
a)Lista de Albert Mackey: 1º - Os processos de reconhecimento são os mais legítimos e inquestionáveis de todos os landmarks. Não admitem mudanças de qualquer espécie, pois, sempre que isso se deu, funestas consequências vieram demonstrar o erro cometido. 2º - A divisão da Maçonaria Simbólica em três graus é um landmark que, mais do que nenhum, tem sido preservado de alterações, apesar dos esforços feitos pelo daninho espírito inovador. Certa falta de uniformidade sobre o ensinamento final da Ordem, no grau de Mestre, foi motivada por não ser o terceiro grau considerado como finalidade; daí o Real Arco e os Altos Graus variarem no modo de conduzirem o neófito à grande finalidade da Maçonaria Simbólica. Em 1813, a Grande Loja de Inglaterra reivindicou este antigo landmark, decretando que a Antiga Instituição Maçõnica consistia nos três primeniros graus de Aprendiz, Companheiro e Mestre, incluindo o Santo Arco Real. Apesar de reconhecido pela sua antiguidade, como um verdadeiro landmark, ele continua a ser violado. 3º - A lenda do terceiro grau é um landmark importante, cuja integridade tem sido respeitada. Nenhum rito existe na Maçonaria, em qualquer país ou em qualquer idioma, em que não seja expostos os elementos essenciais dessa lenda. As fórmulas escritas podem variar e, na verdade, variam; a lenda, porém, do construtor do Templo constitui a essência e a identidade da Maçonaria. Qualquer rito que a excluísse ou a alterasse, materialmente cessaria, por isso, de ser um rito Maçónico. 4º - O governo da Fraternidade por um Oficial que preside; denominado Grão-Mestre, eleito pelo povo maçónico, é o quarto landmark da Ordem. Muitas pessoas ignorantes supõem que a eleição do Grão-Mestre se pratica em virtude de ser estabelecida em lei ou regulamento da Grande Loja. Nos anais da Instituição encontram-se, porém, Grão- MEstres muito antes de existirem Grandes Lojas e, se o actual sistema de governo legislativo por Grandes Lojas fosse abolido, sempre seria precisa a existência de um Grão-Mestre. 5º - A prerrogativa do Grão-Mestre presidir a todas as reuniões maçónicas, feitas onde e quando se fizerem, é o quinto landmark. É em virtude desta lei, derivada da antiga usança, e não de qualquer decreto especial, que o Grão-Mestre ocupa o trono em todas as sessões de qual;quer loja subordinada, quando se ache presente. 6º - A prerrogativa do Grão-Mestre de conceder licença para conferir graus em tempos anormais, é outro e importantíssimo landmark. Os estatutos maçónicos exigem um mês, ou mais, para o tempo que deva transcorrer entre a proposta e a recepção de um candidato. O Grão-Mestre, porém, tem o direito de pôr de lado ou de dispensar essa exigência, e permitir a iniciação imediata. 7º - A prerrogativa que tem o Grão-Mestre de autorização para fundar e manter lojas, é outro importante landmark. Em virtude dele, pode o Grão-Mestre conceder a um número suficiente de Mestres Maçons o privilégio de se reunirem e conferirem graus. As lojas assim constituídas chamam-se "Lojas Licenciadas". Criadas pelo Grão-Mestre, só existem enquanto ele não resolva o contrário, podendo ser dissolvidas por acto seu. Podem viver um dia, um mês ou sei meses. Qualquer, porém, que seja o tempo da sua existência devem-no, exclusivamente, à graça do Grão-Mestre. 8º - A prerrogativa de o Grão-Mestre criar Maçons por sua deliberação é outro landmark importante, que carece ser explicado, controvertida como tem sido a sua existência. O verdadeiro e único modo de exercer essa prerrogativa é o seguinte: o Grão-Mestre convoca em seu auxílio seis Mestres Maçons, pelo menos; forma uma loja e, sem nenhuma prova prévia, confere o grau aos candidatos; findo isso, dissolve a loja e despede os Irmãos. As lojas convocadas por esse meio são chamadas "Lojas Ocasionais" ou de "Emergência". 9º - A necessidade de se congregarem os Maçons em loja é outro landmark. Os landmarks da Ordem sempre prescreveram que os Maçons deviam congregar-se com o fim de se entregarem a tarefas operativas, e que a essas reuniões fosse dado o nome de "loja". Antigamente, eram essas reuniões extemporâneas, convocadas para assuntos especiais e logo dissolvidas, separando-se os Irmãos para, de novo, se reunirem em outros pontos e em outras épocas, conforme as necessidades e as circunstâncias exigissem. Cartas Constitutivas, Regulamentos Internos, Lojas e Oficinas permanentes e contribuições anuais são inovações puramente modernas, de um período relativamente recente. 10º - O governo da Fraternidade, quando congregado em Loja, por um Venerável e dois Vigilantes, é também um landmark. Qualquer reunião de Maçons, congregados sob qualquer direcção, como, por exemplo, um presidente e dois vice-presidentes, não seria reconhecida como loja. A presença de um Venerável e dois Vigilantes é tão essencial que, no dia da congregação, é considerada como uma Carta Constitutiva. 11º - A necessidade de estar numa loja a coberto, quando reunida, é um importante landmark que não deve ser descurado. Origina-se no carácter esotérico da instituição. O cargo de Guarda do Templo que vela para que o lugar das reuniões esteja absolutamente vedado à intromissão de profanos, não depende, em absoluto, de quaisquer leis de Grandes Lojas ou de lojas subordinadas. E o seu dever, por este landmark, é guardar a porta do Templo, evitando que se ouça o que dentro dele se passa. 12º - O direito representativo de cada Irmão, nas reuniões gerais da Fraternidade, é outro landmark. Nas reuniões gerais, outrora chamadas Assembleias Gerais, todos os Irmãos, mesmo os simples Aprendizes, tinham o direito de tomar parte. Nas Grandes Lojas só têm direito de assistência os Veneráveis e os Vigilantes, na qualidade, porém, de representantes de todos os Irmãos das Lojas. Antigamente, cada Irmão representava-se por si mesmo. Hoje, são representados pelos seus Oficiais. Nem por motivo dessa concessão, feita em 1717, deixa de existir o direito de representação, firmado por este landmark. 13º - O direito de recurso de cada Maçon das decisões dos seus Irmãos, em loja, para a Grande Loja ou Assembleia Geral dos Irmãos, é um landmark essencial para a preservação da justiça e para prevenir a opressão. 14º - O direito de todo o Maçon de visitar e tomar assento em qualquer loja é um inquestionável landmark da Ordem. É o consagrado direito de visitar, que sempre foi reconhecido como um direito inerente que todo o Irmão exerce, quando viaja pelo Universo. É a consequência de encarar as lojas como meras divisões, por conveniência, da Família Maçónica Universal. 15º - Nenhum visitante, desconhecido aos Irmãos de uma loja, pode ser admitido à, sem que, antes de tudo, seja examinado, conforme os antigos costumes. Esse exame só pode ser dispensado se o Maçon for conhecido de algum Irmão do Quadro, que por ele se responsabilize. 16º - Nenhuma loja pode intrometer-se em assuntos que digam respeito a outras, nem conferir graus a Irmãos de outros quadros. 17º - Todo o Maçon está sujeito às leis e regulamentos, da Jurisdição Maçónica em que residir, mesmo não sendo membro de qualquer loja. A não filiação é já em si uma falta maçónica. 18º - Por este landmark os candidatos à iniciação devem ser isentos de defeitos ou mutilações, livres de nascimento e maiores. Uma mulher, um aleijado ou um escravo não podem ingressar na Fraternidade. 19º - A crença no Grande Arquitecto do Universo é um dos mais importantes landmarks da Ordem. A negação dessa crença é impedimento absoluto e insuperável para a iniciação. 20º - Subsidiariamente a essa crença é exigida a crença em uma vida futura. 21º - é indispensável a existência, no Altar, de um Livro da Lei, o Livro que, conforma a crença, se supões conter a Verdade revelada pelo Grande Arquitecto do Universo. Não cuidado a Maçonaria de intervir nas peculiaridades de fé religiosa dos seus membros, esses Livros podem variar de acordo com os credos. Exige, por isso, este landmark, que um "Livro da Lei" seja parte indispensável dos utensílios da Loja. 22º - Todos os Maçons são absolutamente iguais dentro da Loja, sem distinções de prerrogativas profanas, de privilégios, que a sociedade confere. A Maçonaria a todos nivela nas reuniões maçónicas. 23º - Este landmark prescreve a conservação secreta dos conhecimentos havidos por iniciação, tanto dos métodos de trabalho, como das suas lendas e tradições que só podem ser comunicadas a outros Irmãos. 24º - A fundação de um ciência especulativa, segundo métodos operativos, o uso simbólico e a explicação dos ditos métodos e dos termos neles empregados, com propósito de ensinamento moral, constitui outro landmark. A preservação da lenda do Templo de Salomão é outro fundamento deste landmark. 25º - O último landmark é o que afirma a inalterabilidade dos anteriores, nada podendo ser-lhes acrescido ou retirado, nenhuma modificação podendo ser-lhes introduzida. Assim como dos nossos antecessores os recebemos, assim os devemos transmitir aos nossos sucessores.
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b)Lista da Grande Loja Unida de Inglaterra (condições de reconhecimento de uma loja estrangeira): 1º - Regularidade de origem, isto é, que cada Grande Loja tenha sido criada regularmente por uma Grande Loja devidamente reconhecida ou por três ou mais lojas regularmente constituídas; 2º - Que a crença no Supremo Arquitecto do Universo e na sua vontade revelada seja condição essencial para a admissão de membros; 3º - Que todos os iniciados prestem o seu compromisso sobro o livro da Lei Sagrada ou com os olhos fixos nesse livro, aberto à sua frente, livro pelo qual se exprime a revelação do Ser Supremo ao qual o indivíduo que acaba de ser iniciado fica, em consciência, irrevogavelmente ligado; 4º - Que a composição da Grande Loja e das lojas particulares seja exclusivamente de homens e que cada Grande Loja não mantenha quaisquer relações maçónicas, seja qual for a sua natureza, com lojas mistas ou com corpos que admitam mulheres como membros; 5º - Que a Grande Loja exerça jurisdição soberana sobre as lojas submetidas à sua obediência, isto é, que seja um organismo responsável, independente e inteiramente autónomo, possuindo uma autoridade única e incontestada sobre o ofício ou os graus simbólicos (Aprendiz registado, Companheiro e Mestre) colocados sob a sua jurisdição, e que não esteja de forma alguma subordinada a um Supremo Conselho ou qualquer outra potência reivindicando controle ou supervisão sobre esses graus, nem partilhe a sua autoridade com esse conselho ou essa potência; 6º - Que as três Grandes Luzes da Maçonaria (isto é, o Livro da Lei Sagrada, o Esquadro e o Compasso) estejam sempre expostos durante os trabalhos da Grande Loja ou das lojas na sua obediência, sendo a principal dessas luzes o volume da Lei Sagrada; 7º - Que as discussões de ordem religiosa e política sejam estritamente proibidas em loja; 8º - Que os princípios dos "Antigos landmarks", costumes e usos do ofício sejam estritamente observados. Estes landmarks foram aceites pela chamada Constituição portuguesa de 1941, elaborada com o único objectivo de concitar o apoio da Maçonaria inglesa ao clandestino Grande Oriente Lusitano Unido, mas jamais postos em prática.
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c) As Maçonarias de feição racionalista e liberal (entre as quais a portuguesa) jamais aceitaram a totalidade destes princípios, de tipo religioso, autoritário e inclusivamente machista. Por isso procuraram, quer separadamente quem em conjunto, redigir "declarações de princípios" mais concordes com a evolução dos tempos e das mentalidades. Vale a pena conhecer, a este respeito, as "conclusões" do maçon português José Afonso da Costa Júnior, publicadas em 1924, no final do seu artigo "O Problema da Regularização de Potências Maçónicas" (Boletim Oficial do Grande Oriente Lusitano Unido, 44º ano, nº 8, Agosto de 1924, pp. 254-255): 1º - As Constituições de Anderson são a base de toda a regularidade, porque nelas está claramente definido o verdadeiro ideal maçónico; 2º - Todas as Potências Maçónicas que aspiram ao reconhecimento legal devem provar que se regulam por Constituições e Regulamentos que, a exemplo da Constituição de Anderson, preconizem a liberdade de pensamento acima de toda a crença religiosa, a tolerância mútua, o respeito pelos outros e por si próprio, que procure a verdade, estude a moral e pratique a solidariedade; 3º - Os princípios são a parte essencial da regularidade maçónica. As fórmulas não têm senão uma importância relativa que não deve prejudicar o valor das ideias fundamentais; 4º - Os ritos e os seus diversos graus são questões internas que nada têm que ver com o problema da universalização da Franco-Maçonaria. Os poderes litúrgicos pertencem indiscutivelmente às Câmaras-Chefes de rito. Tem apenas que atender-se à jurisdição dos três primeiros graus. Uma Potência Simbólica tem que provar que exerce livremente essa jurisdição e que o seu Grão-Mestre não está enfeudado a nenhum poder litúrgico. O mesmo deve ser exigido para os seus dignatários e oficiais; 5º - Para se considerar legítimo, um maçon deve ter sido iniciado ritualmente por uma Loja legalmente constituída. Para se conservar maçon regular, deve estar inscrito no quadro de uma Loja regular, contribuir com a sua quotização, frequentar os trabalhos e cumprir com todos os deveres e obrigações regulamentares;
6º - Para que a Loja se possa considerar legítima, deve ter sido fundada por sete mestres, pelo menos, e deve manter um número bastante de obreiros de modo a formar uma Loja perfeita. O seu funcionamento deve ser autorizado nos termos de uma Patente, outorgada por uma Potência Maçónica legitimamente fundada e constituída e que ocupe legitimamente o território no qual a Loja ergue as suas colunas. 7º - Deve ser reconhecida como Potência Maçónica Legítima toda a Confederação de Lojas legítimas que exerça livremente a jurisdição sobre os três primeiros graus simbólicos, regulando-se po uma Constituição que esteja de acordo com as disposições contidas nos números 1, 2, 3 e 4, e exercendo a sua jurisdição sobre um Território Maçónico considerado livre e aberto à data da sua fundação. Para se conservar Regular, a Potência Legítima deve observar rigorosamente as suas próprias leis e regulamentos que só podem ser alterados na parte internacional por decisão tomada nos Congressos da Associação Maçónica Internacional e esta não visará senão a Maçonaria Simbólica;
8º - Deve entender-se por Território Maçónico a porção territorial de um país ou nação considerado como área de uma Potência Maçónica. Quando esse território está demarcado pelas fronteiras políticas de uma nação, essa área deve ser considerada Território Maçónico Nacional e a Potência que o ocupar será considerada Potência Maçónica Nacional. Or.·. de Lisboa, 14 de Maio de 1924 (e.·. v.·.).
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d) Dê-se como último exemplo a declaração tomada em 1961, em Strasbourg, pelas potências maçónicas constitutivas do chamado C.L.I.P.S.A.S. e aceite pelo Grande Oriente Lusitano a partir de 1984-85: As potências signatárias propõem, para a loja justa e perfeita, a definição seguinte:
As Obediências signatárias do Apelo de Strasbourg afirmam solenemente que as diferenças entre as tradições, os ritos, os símbolos e as opiniões filosóficas, longe de serem fonte de divisão constituem, pelo seu contributo mútuo, ao mesmo tempo um estímulo moral e um enriquecimento espiritual para a compreensão e efectivação da ética maçónica, baseada na tolerância, no respeito pelo próximo, na ligação às liberdades, no sentido de solidariedade, no gosto pela justiça, no combate pelo progresso da sociedade humana e na prática da fraternidade. As Potências assim reunidas estão convencidas de que o respeito pela liberdade de consciência de cada um e uma total tolerância mútua são as condições fundamentais de todo o trabalho maçónico. Em algumas destas Obediências, as lojas invocam o Supremo Arquitecto do Universo; noutras, esta prática é facultativa. Em algumas, um livro considerado sagrado é aberto sobre o altar; noutras não. é indispensável, igualmente, eliminar nos textos fundamentais da União de Strasbourg qualquer fórmula que possa entravar o processo de discussão. As Obediências e as lojas conservam a sua total independência nos planos político, filosófico e religioso. No espírito dos signatários do Apelo de Strasbourg não existe qualquer razão para que a Maçonaria não abra as suas portas a todos os homens de bem e leais, a todos os homens de honra e de probidade, quaisquer que sejam a raça, o nível social ou a opinião filosófica. As únicas condições que a Maçonaria aceira são baseadas nas qualidades morais e intelectuais dos candidatos; quanto ao mais, ela proclama a liberdade absoluta de consciência, a igualdade de todos os homens entre si e a necessidade de laços de fraternidade. Os membros da União de Strasbourg reconhecem o valor tradicional das Constituições de 1723, assim como o direito de toda a Obediência a nelas se inspirar e as interpretar. Mas recusam admitir que esses textos, ou qualquer outro, aliás, confiram a qualquer que seja a Obediência maçónica direitos particulares e, nomeadamente, o de decidir soberanamente das relações que as outras Obediências possam ou não ter entre si. Esta concepção adquire hoje em dia toda a importância pelo facto da extensão da Maçonaria a todos os continentes.
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