O FUTEBOL E A MÍDIA

Antonio Sebastião de Lima, advogado, juiz de direito aposentado, professor de direito constitucional 

 

 

O futebol movimenta cifras astronômicas e se transformou em um negócio internacional altamente lucrativo. Os jogadores que exibirem boa técnica, bom preparo físico e algum carisma, obtêm contratos milionários e se tornam objeto de investimentos no mercado mundial. O alto padrão de vida daí resultante arrefece no atleta a disposição para o combate e reduz o afeto pela bandeira do clube a que está profissionalmente vinculado. Mercadoria valiosa, o jogador circula por vários clubes, nacionais e estrangeiros, o que contribui para a ausência de vínculo psicológico e emocional com a camisa (do clube) que veste no momento. Essa atitude reflete-se no comportamento do jogador quando está servindo a seleção do seu país. A sua preocupação com a performance é diretamente proporcional aos dividendos que isso possa lhe trazer. Por sua vez, os investidores exigem que a mercadoria esteja sempre em evidência, para o retorno financeiro do seu capital. Ainda que o atleta não esteja em boa forma, a sua presença nos campos é exigida à diretoria dos clubes ou aos dirigentes da seleção do seu país de origem, a fim de evitar o prejuízo financeiro do investidor. Daí bons jogadores no banco dos reservas, ou não convocados para a seleção, e a presença de jogadores sem condições técnicas e físicas, dentro do gramado como titulares absolutos. Às favas com os torcedores e o brio nacional. Perde-se uma copa, ganha-se outra. O Brasil poderá ser bonzinho com a Colômbia ou o Paraguai, assim como o foi com a França, sem deixar de ser tetracampeão mundial.

Os meios de comunicação, de um modo geral, apóiam  esse mercado, porque recebem a sua fatia nos lucros. Os repórteres de jornal e televisão endeusam os jogadores que detêm os melhores contratos, mesmo que estejam sem preparo físico e já não apresentem mais a boa qualidade técnica que os levou à fama e à riqueza. Os profissionais da mídia relatam façanhas que nossos olhos não vêem, embora estejamos assistindo ao mesmo jogo, pela televisão ou no estádio de futebol. Exageram as virtudes de uma jogada trivial do jogador eleito e endeusado. Mostram-se pacientes com ele, omitindo os seus erros em campo, fingindo que não viram, para não chamar a atenção do telespectador ou do ouvinte (há torcedores no estádio que acreditam mais nos locutores do que nos seus próprios olhos). Quando o jogador não é o eleito, qualquer jogada infeliz é logo acentuada pelo narrador.      Desse modo, um perna-de-pau pode ser qualificado de “melhor jogador do mundo” porque um dia conseguiu duas ou três jogadas excelentes, ainda que na atualidade não tenha bom controle da bola, perdendo-a facilmente para o adversário. Enquanto os nossos olhos vêem no campo de futebol um jogador sofrível que dificilmente presta uma boa assistência aos companheiros, carecedor do domínio da maior parte dos fundamentos da arte de jogar futebol, e até do oportunismo para fazer gols, os narradores e comentaristas apresentam-no como um craque fora de série. O Brasil tem uma quantidade enorme de bons jogadores além de alguns craques (atletas de refinada técnica e inteligência na sua atividade específica). Não há motivo plausível para dourar a pílula. Além disso, há brasileiros e estrangeiros com opinião própria  que não se deixam enganar.

O melhor jogador do mundo é aquele que apresenta a melhor técnica e o melhor preparo físico durante uma competição mundial, e não o indivíduo promovido pelo empresariado e pela mídia, porque fez uma ou duas boas jogadas em campeonato regional. Entre equipes européias, africanas ou asiáticas, o jogador pode se destacar  por uma habilidade qualquer, como o drible ou o simples oportunismo para fazer gols, mas, entre equipes americanas poderá não ter a mesma desenvoltura. É dentro das quatro linhas, no jogo entre atletas de bom nível técnico, que o melhor há de despontar.

 

 

 

 

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