GARRETT

João Batista da Silva Leitão de Almeida GARRETT nasceu no Porto, a 4 de fevereiro de 1799. Aos doze anos, segue com a família para a Ilha Terceira, por causa da invasão napoleônica. Faz seus estudos primários, sobretudo com seus tios. Em 1816, regressa ao continente e matricula-se na Universidade de Coimbra, no curso de Direito, que termina em 1821. A publicação, nesse mesmo ano, do poema Retrato de Vênus touxe-lhe notoriedade, embora escandalosa. No ano seguinte, está em Lisboa, como oficial do Ministério do Reino. Casa-se com Luíza Midosi. O golpe de Estado de 1822, abolindo a Constituição, obriga-o a refugiar-se na Inglaterra, em vista de suas idéias liberais. Regressa a Lisboa, mas é expulso. Novamente na Inglaterra, entra em contato com o Romantismo inglês. Escreve e publica o poema-romance Camões, Dona Branca (1825, 1826). Em 1826 e 1827, está em Portugal, mas é obrigado a reexilar-se. Em 1831, reúne-se ao exército de D. Pedro IV, na Ilha de Terceira. Depois de frustradas experiências diplomáticas, em 1838 está em Lisboa. Bate-se pelo teatro e dedica-se a carreira literária e política. No fim da vida vive a intensa paixão pela Viscondessa da Luz, Maria Rosa de Montúfar, da qual derivam suas Folhas caídas. Faleceu a 9 de dezembro de 1854.
Dotado de extraordinária sensibilidade e de disposição para as situações que envolvem os sentimentos e o senso de oportunidade, foi o mais acabado representante do espírito romântico em Portugal. Sua formação, com ser arcádica, permaneceu fortemente arraigada e em mais de um passo vinha à tona. O paradoxal resultante das duas vias de acesso ao real deu à sua personalidade características especiais, pelo que representam de permanente luta travada entre as razões opostas nascida do bom senso, de um lado, e do sentimento, do outro. O que isto contém de contraditório acaba sendo das marcas mais originais de seu caráter, enquanto homem e artista. Sua obra e sua ação em qualquer terreno evidenciam essa ambivalência, não raro manifestada por meio de excessivo egoísmo e vaidade próxima do mais exacerbado narcisismo.
Na poesia, evoluiu do Arcadismo para um Romantismo ainda mesclado de lamentos arcádicos, até que, ao fim, com as Folhas Caídas, alcançasse notas mais nitidamente românticas.
No teatro, embora não se dê idêntica evolução, tem-se um Garrett preso inicialmente aos tipismos clássicos (Mérope e Catão); com o Romantismo, recupera o sentido vicentino da arte cênica (Um Auto de Gil Vicente) e se dispõe a fazer teatro de motivo histórico (Filipa de Vilhena, Frei Luís de Souza), parcialmente identificável com o espírito romântico, mais propenso, nessa área literária, a apreciar a mistura do sério e do cômico, o que, de resto, realizou com O Alfageme de Santarém.
Na prosa, depois dos tratados doutrinários (Da Educação) e do romance histórico (Arco de Santana), uns e outros de limitada importância, alcançou o ápice com As Viagens na Minha Terra. Além dessas obras, algumas delas das mais significativas do romantismo português, deixou dispersa mas constante atividade no sentido de trazer a Portugal as tendências que ia conhecendo no exílio, na poesia, com a publicação de Camões e Dona Branca e, no teatro, com a criação do teatro nacional.

BARCA BELA

Pescador da barca bela,
Onde vás pescar com ela,
Que é tão bela,
Ó pescador?

Não vês que a última estrela
No céu nublado se vela?
Colhe a vela,
Ó pescador!

Deita o lanço com cautela
Que a seria canta bela…

Não se enrede a rede nela,
Que perdido é remo e vela
Só de vê-la,
Ó pescador!

Pescador da barca bela,
Inda é tempo, foge dela,
Foge dela
Ó pescador!


ESTE INFERNO DE AMAR

Este inferno de amar - como eu amo! -
Quem mo pôs aqui n´alma… quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é vida - e que a vida destrói -
Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há de ela apagar?

Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez… - foi um sonho -
Em que paz tão serena a dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar…
Quem me veio, ai de mim! despertar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei… dava o Sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? - Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei…

 


AS DUAS ROSAS

Sobre se era mais formosa 
A vermelha ou branca rosa,
Ardeu séculos a guerra
	Em Inglaterra.

Paz entre as duas, jamais!
Reinar ambas as rivais,
Também não;  e uma ceder
	Como há de ser?

Faltei eu lá na Inglaterra
P'ra acabar com a guerra.
Ei-las aqui bem iguais,
	Mas não rivais.

Atei-as em laço estreito:
Que artista fui, com que jeito!
E oh! Que lindas são, que amores
	As minhas flores!

Dirão que é cópia; - bem sei:
Que todo inteiro o roubei
Meu pensamento brilhante 
	Do teu semblante…

Será. Mas se é tão belo
Que lhe dêem esse modelo,
Do meu quadro, na verdade,
	Tenho vaidade.

FOLHETIM | LITERATURA | GRAMÁTICA | CONTATO | HTML