Linguagem
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Fevereiro/2014


História

Ditos seculares

Obra do século 17 permite reconstituir o sentido mais antigo de expressões populares

Por Jean Lauand

Após sua memorável atuação nos 6 a 1 sobre o Celtic em 11 de dezembro passado, Neymar declarou ao repórter da TV española:

– Agora é trocar o chip e colocar o da Liga [dos Campeões].

O pobre repórter não entendeu essa e outras respostas em português neymariano, mas com essa bela metáfora o craque expressava que era hora de esquecer o passado, os tropeços recentes no campeonato espanhol, e focar a Champions League.

Não podemos prever o futuro da expressão “trocar o chip” no uso figurado da linguagem: se daqui a 5, 10, 50 ou 300 anos continuará sendo empregada: algumas metáforas oriundas da tecnologia tornam-se obsoletas como as próprias realidades que as inspiraram: ninguém hoje apelidaria uma Rita de Cássio Coutinho de Rita Cadillac, alcunha, por sua vez, tomada do nome artístico de uma famosa vedete de filmes franceses da década de 60, quando o Cadillac era, para todos, imediata referência de glamour e outros atributos. Por outro lado, continuamos usando metáforas da época da Revolução Industrial, como quando dizemos que a campanha para a reeleição já começou e “a todo vapor”, etc.

Tecnológicas ou não, algumas expressões e frases feitas desaparecem rapidamente, outras duram milênios, como no caso de tantas expressões bíblicas: bode expiatório, dois pesos e duas medidas etc. etc. etc. 

Há expressões que, passados 350 anos, ainda usamos, com sentido idêntico ou não, e que remontam, direta ou indiretamente, a uma formulação proverbial – mais ampla e contextualizante –, hoje esquecida. Recolhemos a seguir, mantendo a grafia original, algumas expressões apresentadas em 1651 (claro que muitas são de séculos anteriores) na obra de Antonio Delicado, Adagios portuguezes reduzidos a lugares communs, e que ainda hoje são usadas.





Conteúdo extra (só no site):

Pegar pela palavra
“[Pega-se] Ao boy pello corno e ao homem pella palavra”.


Pentear macacos (asno)
“Tal grado haja, quem o asno pentea”. No sentido de: para quem gosta é prato cheio.


Quem viver, verá
“Quem viver, verá a volta que o mundo dá”.


Rodeios (ao falar)
“Quem por rodeos falla, com arte anda”. (Arte = falar enganoso)


Salve-se quem puder!
“A barca é rota, salve-se quem poder”.


Uma no cravo; outra na ferradura
“Castigo de dura: huma no cravo, outra na ferradura”. A prudência que tempera o castigo, torna a lição duradoura.


Ver estrelas
“Farte-ei ver as astrellas ao meyo dia”.


Subir à cabeça
“Boa é a fazenda [riqueza], quando nam sobe à cabeça”.


Outros baratos
“Nam jogo aos dados, mas faço outros peiores baratos”. Frei Joaquim de Santa Rosa de Viterbo explica: “‘barato’ se toma em mui diversas significações em os nossos antigos documentos do século XV e XVI, v.g. ‘haver por seu barato’: ter por bem; ‘esperar um barato da fortuna’: esperar um favor ou benefício da fortuna; etc.” (Elucidário das palavras, termos e frases que em Portugal antigamente se usaram e que hoje regularmente se ignoram, Lisboa, Fernandes Lopes ed., 2ª. ed., 1865.)

 



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