RENASCE O MOVIMENTO ESPERANTISTA CATÓLICO

 

por AFFONSO SOARES

        Ha alguns anos, grande parte dos esforços esperantistas no Brasil eram geralmente mal interpretados pelo fato de ser esmagadora a presença intensamente atuante dos espíritas. O autor deste artigo chegou a ouvir, nos anos 60, de um veterano esperantista de confissão católica, o saudoso Prof. Dr. Carlos Domingues, então Presidente da Liga Brasileira de Esperanto, curioso relato que evidenciava o fato com um traço levemente humorístico: queixava-se aquele grande esperantista de estar freqüentemente recebendo cartas dirigidas a Liga com pedidos de receitas mediúnicas e orientação espiritual...

        Certamente a causa de tal anomalia não estava na atitude dos espíritas, cujas ações em favor daquele grande ideal sempre se têm pautado pela mais rigorosa observância dos princípios éticos da Doutrina Espírita e do Esperanto. E bem provável que os verdadeiros motivos estivessem na quase que absoluta ausência de outros círculos religiosos no movimento esperantista brasileiro e na deficiência de uma estrutura de divulgação dos círculos do movimento esperantista neutro, pela qual o público pudesse informar-se a respeito da natureza e do objetivo do esperanto, inobstante os cuidados com que os espíritas sempre cercaram e cercam as suas atividades nesse setor.

        Hoje, felizmente, graças ao visível fortalecimento, qualitativo e quantitativo, das instituições esperantistas, já não se criam semelhantes confusões, ao mesmo tempo em que mais estreitos se vão tornando os vínculos entre o Movimento Espírita e o movimento esperantista, expressos em sólidas relações de fraternidade e por uma constante colaboração recíproca.

        Mas, se, por um lado, revelou-se a vitalidade dos círculos neutros, por outro lado nenhuma reação se verificava nos círculos religiosos esperantistas, notadamente o católico e o protestante, ainda e sempre marcados pela quase que absoluta ausência, não obstante as sucessivas ações da Liga Brasileira de Esperanto em favor de sua reativação.

        Agora, porém, graças ao idealismo de do idealismo fervorosos esperantistas de Sorocaba (SP), Eluízio Bueno e Ângela (Caixa Postal 234--CEP: 180001-970), vai ressurgindo o movimento esperantista católico, a princípio pela regularidade com que é editado o excelente periódico Brazila Katoliko (Católico Brasileiro), mantido pelas colaborações espontâneas de adeptos da causa de Zamenhof no Brasil, católicos e não católicos.

        E o que nos leva a destacar o evento em nossa coluna não é apenas a revitalização de um importante segmento da vida esperantista em nosso País, mas também, e principalmente, o fato de que o Brazila Katoliko reflete em sua postura os elevados princípios do esperantismo, contrárias a todo e qualquer tipo de sectarismo. Com destaque em sua primeira página (nº de jan/fev/mar-96), a Redação anuncia e elogia uma bela iniciativa dos espíritas em favor do Esperanto sob os asuspícios do Centro de Ensino Fundamental "Bezerra de Menezes", mantido pelo Centro Espírita Bezerra de Menezes, em Sobradinho, Brasília (DF). A prova de que nossos co-idealistas Eluízio e Ângela desenvolvem um trabalho digno do apreço dos círculos esperantistas é o fato de que entre os colaboradores para a publicação do Brazila Katoliko figuram conhecidos militantes do Movimento Espírita, bem como profitentes de outras correntes do pensamento filosófico.

        E essa, sem dúvida alguma, uma demonstração frisante do quanto as ideias esperantistas podem ser úteis aos movimentos religiosos, por educarem seus adeptos para a vivência dos reais e elevados princípios éticos de suas respectivas crenças, assim promovendo a união sobre aquele fundamento neutro preconizado tanto por Allan Kardec como por Lázaro Zamenhof e concretizado pela pura Doutrina do Cristo.

        Vale a pena aqui salientar que à época em que a Federação iniciava suas atividades em torno do Esperanto (19O9), os católicos e os protestantes fundavam suas organizações esperantistas internacionais: em 1910 nascia a IKUE -- Internacia Katolika Unuigxo Esperantista (União Católica Esperantista Internacional) e em 1911 fundava-se a KELI--Kristana Esperantista Ligo Internacia (Liga Crista Esperantista Internacional), as quais, não obstante um permanente esforço de divulgação, notadamente nos congressos universais de Esperanto, muito pouca influência tem exercido entre os católicos e protestantes do Brasil, sendo digno de menção o fato de que a Rádio do Vaticano mantém programação semanal em Esperanto transmitida para o mundo inteiro e haver sido publicado em Esperanto, no ano passado, em dois volumes com 900 páginas, o Missal Romano, edição do próprio Vaticano.

        São auspiciosos, portanto, para o movimento esperantista do Brasil, os indícios de que renasce o movimento católico, tendo a frente os dois competentes idealistas de Sorocaba a quem desejamos todo êxito e que se mantenham incondicionalmente fiéis aos superiores princípios de fraternidade do ideário esperantista.

( artigo da revista Reformador nº 2012,  novembro, 1996 )

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