Um brevíssimo contato com Manuel Bandeira


Lamentavelmente são poucos os que ainda lêem Bandeira, poeta que possui um estilo específico dentro da Literatura Brasileira. Seu primeiro livro, A cinza das horas, publicado em 1917 é marcado pelo tom fúnebre , carregado ainda de influências parnasianas.

O Eu Lírico vivencia o ato de morrer à medida que (des)escreve sua agonia em seus versos que são seu sangue.

Desencanto

"Eu faço versos como quem chora
De desalento...de desencanto...
(...)
Meu verso é sangue.

Volúpia ardente...(grifo nosso)"

O amor corrói o coração do poeta que convive no limiar da morte e da vida, em Chama e fumo

"Antes de tudo ele é gosto e graça.
Amor, fogueira linda a arder!
Amor-chama, e, depois, fumaça

Porquanto, mal se satisfaça
(Como te poderei dizer?...)
O fumo vem, a chama passa...

A chama queima. O fumo embaça.
Tão triste que é! Mas...tem de ser...
Amor?...-chama, e, depois, fumaça:
O fumo vem, a chama passa."

Mas paradoxalmente, Eros vem resgatar o poeta para a vida, ainda em A cinza das horas, a luz do amor/vida renasce no poeta.(Poemeto erótico)

"Teu corpo claro e perfeito
- Teu corpo de maravilha,
Quero possuí-lo no leito
Estreito de redondilha

(...)
A todo o momento o vejo...
Teu corpo ... a única ilha
No oceano do meu desejo...

Teu corpo é tudo o que brilha,
Teu corpo é tudo o que cheira...
Rosa, flor de laranjeira"

O poeta vai se distanciando da morte através da descoberta do corpo feminino, que lhe liberta e ao mesmo tempo o aprisiona na sua ilha, trazendo-o de volta para morte, uma vez que o corpo feminino é inacessível.

O poeta aos poucos vai se distanciando do tom melancólico, dos altos e baixos de sua trajetória e da musicalidade simbolista. Em Carnaval, seu segundo livro ( 1919) ainda "mascarado" faz uso da musicalidade simbolista como ainda muito próximo do tom melancólico. . O Eu lírico excluído da sua cidade à ponto de viver um carnaval sem alegrias, como vemos no poema Epílogo.

Eu quis um dia, como Schumann, compor
Um carnaval todo subejtivo:
Um carnaval em que só o motivo
Fosse o meu próprio ser interior...

Quando acabei- a diferença que havia!
O de Schumann é um poema cheio de amor,
E de frescura, e de mocidade...
E o meu tinha a morta morta-cor
Da senilidade e da amargura...
- O meu Carnaval sem nenhuma alegria!....

No poeta gradativamente vai surgindo um desejo de romper e desmitificar esta melancolia, buscando na dicotomia amor/morte, uma relação dionisíaca com a vida.

Bacanal

"Quero beber! Cantar asneiras
No esto brutal das bebedeiras
Que tudo emborca e faz em caco...
Evoé Baco!

Lá se me parte a alma levada
No torvelim da mascarada
A gargalhar em doudo assomo...
Evoé Momo!"

Em Ritmo Dissoluto de 1924, após a Revolução Estética de 22, Bandeira está dissolvendo seu ritmo poético, dissolvendo sua melancolia, existindo ainda alguns resquícios da musicalidade simbolista, mas Bandeira já está muito próximo de usar um ritmo totalmente livre, se aproxima do grito dado pelos poetas da Semana.

Os sinos

Sino de Belém
Sino da Paixão...
(...)
Sino de Belém, pelos que inda vem!
Sino de Belém bate bem-bem-bem.
(...)

Os sinos já anunciam sua libertação da Tradição Parnasiana.

O grito de Bandeira acontece então efetivamente em Libertinagem. O poeta traz ainda a melancolia que marcou seus poemas, mas já vislumbra uma cidade onde pode sonhar e deseja, melancolicamente, partir para Pasárgada, resgatar uma infância, ter a mulher na cama de sua livre escolha. Bandeira enfim, com o ritmo dissolvido, sem máscaras, liberta-se e envereda para a construção de um novo estilo literário, já na maturidade cria novas formas estilísticas, fazendo uso do ready-made lingüístico, como vemos em Construção e já aguarda a morte,em Preparação para a morte reconhecendo nela o fim do milagre de viver.

"- Bendita a morte, que é o fim de todos os milagres."

 

Poemas de Manuel Bandeira

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