Seguimos no dia combinado para o aeroporto,
onde deveríamos encontrar já embarcados os amigos cariocas
que completariam o grupo. Minha maior curiosidade estava no fato de que
nunca tinha pescado no conforto de um barco hotel, estava acostumado a
armar rede na mata e amargar o calor da região sem a mordomia de
uma cabine com ar condicionado. Recentes relatos de amigos insatisfeitos
com estes serviços me deixaram um pouco apreensivo com o que eu
iria encontrar. Chegamos a Manaus em meio a inúmeras brincadeiras
e uma viagem tranqüila, e não tardou para que o ônibus
que deveria transportar o grupo estacionasse em frente a área de
desembarque do aeroporto e tivéssemos nossas bagagens acomodadas
no bagageiro seguindo para a marina onde estava ancorado o barco.
Deveríamos esperar ainda algumas horas
para iniciar a navegação, pois faltava ainda um pescador
que vinha de Minas Gerais e estava perdido entre inúmeras conecções
devendo ainda demorar a chegar. Navegamos por toda a noite e só
chegamos ao destino no dia seguinte por volta das 13:00 hs., sendo que
durante a navegação tivemos tempo de sobra para preparar
toda a tralha de pesca, passando as linhas nas carretilhas, amassando as
farpas das garatéias e ajeitando as iscas nas caixas. Quando enfim
embarcamos nas voadeiras o cenário embora parecesse ideal aos amigos
inexperientes, não era lá muito animador aos meus olhos!
O rio Xeruini é um afluente do rio Branco
e estávamos a cerca de duas horas acima deste grande rio de águas
barrentas onde apesar de muito seco acaba com seu maior volume de água
represando o inicio dos seus afluentes. O nível das águas
neste ponto do Xeruini era ainda muito alto e certamente os Tucunas estariam
no meio da mata alagada (Cacaia). Junto com o Wagner, meu parceiro neste
primeiro dia e com um piloteiro do Miss Bebel, começamos a trabalhar
as iscas artificiais junto as prováveis estruturas que abrigariam
os peixes sem obter no entanto nenhum sucesso. Comecei a trabalhar uma
isca de hélice na tentativa de chamar a atenção dos
tucunarés e seduzi-los a sair da mata para abocanhar a barulhenta
isca, e de novo nada de peixe.
Wagner já cansado de trabalhar iscas grandes
resolveu curtir a paisagem magnífica que se descortinava a cada
curva de igarapé e trabalhar uma isca de meia água pequena
sem se incomodar com a gozação a respeito da frágil
isca que não resistiria ao ataque de meio tucunaré, e não
demorou muito para fisgar sua primeira piranha e como uma criança
na Disneylândia comemorava e pedia foto do seu troféu de mais
ou menos um quilo! Só no final da tarde batendo uma ponta de praia
tive meu esforço recompensado com o ataque de um tucunaré
paca de mais ou menos 1,5 Kg que explodiu na isca de hélice com
violência e salvou o dia com sua valentia.
Retornando ao barco hotel ficamos sabendo que
o dono da embarcação havia decidido subir o rio mais algumas
horas, para que pudéssemos encontrar uma situação
de pesca mais favorável. No dia seguinte já estávamos
no novo pesqueiro que embora ainda tivesse com o nível do rio alto
era o limite onde poderia chegar o grande barco hotel sem comprometer a
navegação na volta. Novamente com o Wagner seguimos na voadeira
por mais 1,5 horas rio acima onde começamos a encontrar lagos um
pouco mais secos e os Tucunarés não demoraram a aparecer!
Foi o começo da festa, com varias ações de tucunas
pesando de 1,5 a 3,0 Kg, fui brindado com o troféu do dia que pesava
exatos 4,0 Kg segundo a balança do amigo Wagner.
Nos dias que se seguiram tive o prazer de ver
meu parceiro fisgar e comemorar a cada tucunaré borboleta que explodia
em sua isca, todos pequenos é verdade, sempre em torno de 2 Kg,
lembro que esta espécie não atinge grandes proporções,
mas tem a força de um Açu de 3,0 Kg. O bichinho é
valente! Nos outros barcos a situação foi semelhante em toda
a pescaria, cabendo aos amigos que contavam com os guias nativos da região
(apenas três guias eram nativos) alguma vantagem para localizar lagos
centrais onde sempre a probabilidade de fisgar um troféu é
maior. Digo "alguma" vantagem, pois percebemos que embora conhecedores
da região os guias nativos pareciam sonegar informação
sobre estes lagos centrais e se por um lado de vez em quando se "lembravam"
de um bom pesqueiro tinham a desvantagem de não parecerem comprometidos
com o sucesso da pescaria, o que nos demais guias era uma preocupação
constante.
Nenhum problema para quem se acostumou a descobrir
sozinho os mais produtivos pontos de um rio, e comemorar além do
sucesso de fisgar bons troféus, o aprendizado na identificação
dos melhores pontos de pesca. Mas é algo preocupante para o pescador
novato que acredita estar contratando um serviço que colocará
sua isca na boca do maior peixe fisgado pelo grupo!
Ao final pude tirar minhas conclusões
sobre ter ou não mordomias de barco hotel pescando na Amazônia:
a viagem correu tranqüila e confortável, cabendo aos pescadores
apenas a preocupação com seu equipamento e na localização
dos peixes, sem nenhum contratempo maior que fosse de responsabilidade
da equipe do barco hotel. Apesar de oferecer algumas restrições
quanto aos locais de acesso pelo porte do barco, inibindo a descoberta
de locais realmente intocados pelo homem, o conforto faz com que a pescaria
não seja cansativa (fisicamente) alem de proporcionar uma segurança
e comodidade sem iguais se comparada aos acampamentos.
Foram fisgados Tucunarés pesando 7 Kg,
o que acredito ser um peixe de respeito que não deixa margem para
reclamações sobre a qualidade do local escolhido para a pesca.
O serviço oferecido pelo Miss Bebel correspondeu a minhas expectativas,
e como de costume indico este serviço aos meus amigos, pois nesta
experiência que tive tudo saiu perfeito. Lembro aos amigos que não
ganho nada para promover esta ou aquela estrutura de pesca indicando apenas
serviços com os quais saí satisfeito. A opção
de viajar sem este conforto pode se traduzir em aventuras emocionantes
e talvez estabelecer acampamento em locais intocados, mas devemos pensar
que isto nem sempre é verdade, pois depende de uma organização
difícil e um planejamento muito mais trabalhoso!
Tudo é experiência adquirida, o
importante é tirar de cada pescaria um novo aprendizado, uma nova
historia e a paz que recarrega nossas baterias físicas e mentais
tão esgotadas com a realidade do mundo moderno!