Poética II - Vinícius

     Com as lágrimas do tempo
     E a cal do meu dia
     Eu fiz o cimento
     Da minha poesia

     E na perspectiva
     Da vida futura
     Ergueu em carne viva
     Sua arquitetura

     Não sei bem se é casa
     Se é torre ou se é templo
     (um templo de Deus)
     Mas é grande e clara
     Pertence ao seu tempo.
     - Entrai, irmãos meus!

Soneto de Amor Total - Vinícius

     Amo-te tanto, meu amor...não cante
     O humano coração com mais verdade...
     Amo-te como amigo e como amante
     Nunca, sempre diversa realidade.

     Amo-te afim, de um calmo amor prestante,
     E te amo além, presente na saudade.
     Amo-te, enfim, com grande liberdade
     Dentro da eternidade e a cada instante.

     Amo-te como um bicho, simplesmente
     De um amor sem mistério e sem virtude
     Com um desejo maciço e permanente.

     E de amar assim muito amiúde
     É que um dia em teu corpo de repente
     Hei de morrer de amar mais do que pude.

Soneto de Fidelidade - Vinícius

     De tudo ao meu amor serei atento
     Antes e com tal zelo e sempre e tanto
     Que mesmo em face do maior encanto
     Dele se encante mais meu pensamento

     Quero vive-lo em cada vão momento
     E em seu louvor hei de espalhar meu canto
     E rir meu riso e derramar meu pranto
     Ao seu pesar ou seu contentamento

     E assim quando mais tarde me procure
     Quem sabe a morte, angústia de quem vive
     Quem sabe a solidão, fim de quem ama

     Eu possa lhe dizer do amor que tive
     Que não seja imortal, posto que é chama
     Mas, que seja infinito enquanto dure.

Soneto de Separação - Vinícius

     De repente do riso fez-se o pranto
     Silencioso e branco como a bruma
     E das bocas unidas fez a espuma
     E das mãos espalmadas fez o espanto

     De repente da calma fez-se o vento
     Que dos olhos desfez-se a última chama
     Da calma fez-se o pressentimento
     Do momento imóvel fez-se o drama

     De repente não mais que de repente
     Fez-se de triste o que se fez amante
     E de sozinho o que se fez contente

     Fez-se do amigo próximo o distante
     Fez-se da vida uma aventura errante
     De repente não mais que de repente.

Soneto do amor demais - Vinícius

     Não, já não amo mais os passarinhos
     A quem, triste, contei tanto segredo
     Nem amo as flores despertadas cedo
     Pelo vento orvalhado dos caminhos.

     Não amo mais as sombras do arvoredo
     Em seu suave entardecer de ninhos
     Nem amo receber outros carinhos
     E até de amar a vida tenho medo.

     Tenho medo de amar o que de cada
     Coisa que der resulte empobrecida
     A paixão do que se der à coisa amada

     E que não sofra por desmerecida
     Aquela que me deu tudo na vida
     E que de mim só quer amor - mais nada.

Soneto do amigo - Vinícius

     Enfim, depois de tanto erro passado
     Tantas retaliações, tanto perigo
     Eis que ressurge noutro o velho amigo
     Nunca perdido, sempre reencontrado.

     É bom sentá-lo novamente ao lado
     Com os olhos que contem o olhar antigo
     Sempre comigo um pouco atribulado
     E como sempre singular comigo.

     Um bicho igual à mim, simples e humano
     Sabendo se mover e comover
     E a disfarçar com meu próprio engano.

     O amigo: um ser que a vida não explica
     Que só se vai ao ver outro nascer
     E o espelho de minha alma multiplica...

A Rosa de Hiroshima - Vinícius

     Pensem nas crianças
     Mudas telepáticas
     Pensem nas meninas
     Cegas inexatas
     Pensem nas mulheres
     Rotas alteradas
     Pensem nas feridas
     Como rosas cálidas
     Mas oh não se esqueçam
     Da rosa da rosa
     Da rosa de Hiroshima
     A rosa hereditária
     A rosa radioativa
     Estúpida e inválida
     A rosa com cirrose
     A anti-rosa atômica
     Sem cor sem perfume
     Sem rosa sem nada

Procura-se um amigo - Vinícius

     Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimento, basta ter coração.
     Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir.
     Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto dos ventos e das canções da brisa.
     Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.
     Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo.
     Deve guardar segredo sem se sacrificar.
     Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão.
     Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados.
     Não é preciso que seja puro, nem que seja de todo impuro, mas não deve ser vulgar.
     Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa.
     Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo.
     Deve sentir pena das pessoas tristes e compreender o imenso vazio dos solitários.
     Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.
     Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando chamado de amigo.
     Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grande chuvas e das recordações de infância.
     Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade.
     Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim.
     Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo.
     Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas.
     Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.

Para Viver um Grande Amor - Vinícius

     Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso - para viver um grande amor.
     Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de muitas, poxa! é de colher... -não tem nenhum valor.
     Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro-seja lá como for.
     Há que fazer de corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada – para viver um grande amor.
     Para viver um grande amor, vos digo, é preciso atenção como o “velho amigo”, que porque é só vos quer sempre consigo para iludir o grande amor.
    É preciso muitíssimo cuidado com quem quer que não esteja apaixonado, pois quem não está, está sempre preparado para chatear o grande amor.
     Para viver um grande amor, na realidade, há que compenetrar-se da verdade de que não existe amor sem fieldade - para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vanidade é desconhecedor da liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só amor.
     Para viver um grande amor, il faut, além de ser fiel, ser bem conhecedor de arte culinária e de judô - para viver um grande amor.
     Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito - peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.
     É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista - muito mais, muito mais que na modista! – para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...
     Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões , sopinhas, molhos, estrogonofes - comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma rica e gostosa farofinha, para o seu grande amor?
     Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto - para não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também co a mente, pois qualquer “baixo” seu, a amada sente - e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia -  para viver um grande amor.
     É preciso saber tomar uísque ( com o mau bebedor nunca se arrisque!) e ser impermeável ao diz-que-diz-que – que não quer nada com o amor.
     Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva oscura e desvairada não se souber achar a bem-amada - para viver um grande amor.

Receita de Mulher - Vinicius de Moraes
 
    As muito feias que me perdoem
     Mas beleza e fundamental. E preciso
     Que haja qualquer coisa de flor em tudo isso
     Qualquer coisa de dança, qualquer coisa de “haute couture”
     Em tudo isso ( ou então
     Que a mulher se socialize elegantemente em azul, como na
     Republica Popular Chinesa).
     Não ha meio-termo possível. E preciso
     Que tudo isso seja belo. E preciso que súbito
     Tenha-se a impressão de ver uma garça apenas pousada e que um rosto
     Adquira de vez em quando essa cor só encontravel no terceiro minuto
     da aurora.
     E preciso que tudo isso seja sem ser, mas que se reflita e desabroche
     No olhar dos homens. E preciso, e absolutamente preciso
     Que seja tudo belo e inesperado. E preciso que umas pálpebras cerradas
     Lembrem um verso de Eluard e que se acaricie nuns braços
     Alguma coisa alem de carne: que se toque
     Como no âmbar de uma tarde. Ah, deixai-me dizer-vos
     Que e preciso que a mulher que ali esta como a corola ante o pássaro
     Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e
     Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem
     Com olhos e nádegas. Nádegas e importantíssimo. Olhos, então
     Nem se fala, que olhem com certa maldade inocente. Uma boca
     Fresca (nunca úmida!) e também de extrema pertinência.
     E preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos
     Despontem, sobretudo a rotula no cruzar das pernas, e as pontas
     pélvicas
     No enlaçar de uma cintura semovente.
     Gravíssimo e porem o problema das saboneteiras: uma mulher sem
     saboneteiras
     E como um rio sem pontes. indispensável
     Que haja uma hipótese de barriguinha, e sem seguida
     A mulher se alteie em cálice, e que seus seios
     Sejam uma expressão greco-romana, mais que gótica ou barroca
     E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas.
     Sobremodo pertinaz e estarem a caveira e a coluna vertebral
     Levemente a mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
     Os membros que terminem como hastes, mas que haja um certo volume de
     coxas
     E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima
     penugem
     No entanto, sensível a caricia em sentido contrario.
     E aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio
     Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!).
     Preferíveis sem duvida os pescoços longos
     De forma que a cabeça de por vezes a impressão
     De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre
     Flores sem mistério. Pés e mãos devem conter elementos góticos
     Discretos. A pele deve ser fresca nas mãos, nos braços, no dorso e na
     face
     Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca
     inferior
     A 37* centígrados, podendo eventualmente provocar queimaduras
     Do primeiro grau. Os olhos, que sejam de preferencia grandes
     E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da terra; e
     Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro de paixão
     Que e preciso ultrapassar. Que a mulher seja em principio alta
     Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
     Ah, que a mulher de sempre a impressão de que se fechar os olhos
     Ao abri-los ela não mais estará presente
     Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
     E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer
     beber
     O fel da duvida. Oh, sobretudo
     Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
     Não importa em que circunstancias, a sua infinita volubilidade
     De pássaro; e que acriciada no fundo de si mesma
     Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
     O impossível perfume; e destile sempre
     O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
     Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
     Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
     Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.

Operário em Construção

     Vinicius de Moraes

     Era ele que erguia casas
     Onde antes só havia chão.
     Como um pássaro sem asas
     Ele subia com as asas
     Que lhe brotavam da mão.
     Mas tudo desconhecia
     De sua grande missão:
     Não sabia por exemplo
     Que a casa de um homem e’ um templo
     Um templo sem religião
     Como tampouco sabia
     Que a casa quer ele fazia
     Sendo a sua liberdade
     Era a sua escravidão.
     De fato como podia
     Um operário em construção
     Compreender porque um tijolo
     Valia mais do que um pão?
     Tijolos ele empilhava
     Com pá’, cimento e esquadria
     Quanto ao pão, ele o comia
     Mas fosse comer tijolo!
     E assim o operário ia
     Com suor e com cimento
     Erguendo uma casa aqui
     Adiante um apartamento
     Alem uma igreja, ‘a frente
     Um quartel e uma prisão:
     Prisão de que sofreria
     Não fosse eventualmente
     Um operário em contracto.
     Mas ele desconhecia
     Esse fato extraordinário:
     Que o operário faz a coisa
     E a coisa faz o operário.
     De forma que, certo dia
     ‘A mesa, ao cortar o pão
     O operário foi tomado
     De uma súbita emoção
     Ao constatar assombrado
     Que tudo naquela mesa
     ? Garrafa, prato, facão

     Era ele quem fazia
     Ele, um humilde operário
     Um operário em construção.
     Olhou em torno: L gamela
     Banco, enxerga, caldeirão
     Vidro, parede, janela
     Casa, cidade, nação!
     Tudo, tudo o que existia
     Era ele quem os fazia
     Ele, um humilde operário
     Um operário que sabia
     Exercer a profissão.
     Ah, homens de pensamento
     Não sabereis nunca o quanto
     Aquele humilde operário
     Soube naquele momento
     Naquela casa vazia
     Que ele mesmo levantara
     Um mundo novo nascia
     De que sequer suspeitava.
     O operário emocionado
     Olhou sua própria mão
     Sua rude mão de operário
     De operário em construção
     E olhando bem para ela
     Teve um segundo a impressão
     De que não havia no mundo
     Coisa que fosse mais bela.
     Foi dentro dessa compreensão
     Desse instante solitário
     Que, tal sua construção
     Cresceu também o operário
     Cresceu em alto e profundo
     Em largo e no coração
     E como tudo que cresce
     Ele não cresceu em vão
     Pois alem do que sabia
     ? Excercer a profissão -

     O operário adquiriu
     Uma nova dimensão:
     A dimensão da poesia.
     E um fato novo se viu
     Que a todos admirava:
     O que o operário dizia
     Outro operário escutava.
     E foi assim que o operário
     Do edifício em construção
     Que sempre dizia “sim”
     Começam a dizer “não”
     E aprendeu a notar coisas
     A que não dava atenção:
     Notou que sua marmita
     Era o prato do patrão
     Que sua cerveja preta
     Era o uísque do patrão
     Que seu macacão de zuarte
     Era o terno do patrão
     Que o casebre onde morava
     Era a mansão do patrão
     Que seus dois pés andarilhos
     Eram as rodas do patrão
     Que a dureza do seu dia
     Era a noite do patrão
     Que sua imensa fadiga
     Era amiga do patrão.
     E o operário disse: Não!
     E o operário fez-se forte
     Na sua resolução
     Como era de se esperar
     As bocas da delação
     Começaram a dizer coisas
     Aos ouvidos do patrao
     Mas o patrao nas queria
     Nenhuma preocupacao.
     ? “Convencam-no” do contrario

     Disse ele sobre o operario
     E ao dizer isto sorria.
     Dia seguinte o operario
     Ao sair da construcao
     Viu-se subito cercado
     Dos homens da delacao
     E sofreu por destinado
     Sua primeira agressao
     Teve seu rosto cuspido
     Teve seu braco quebrado
     Mas quando foi perguntado
     O operario disse: Não!
     Em vao sofrera o operario
     Sua primeira agressao
     Mouitas outras seguiram
     Muitas outras seguirao
     Porem, por imprescindivel
     Ao edificio em construcao
     Seu trabalho prosseguia
     E todo o seu sofrimento
     Misturava-se ao cimento
     Da construcao que crescia.
     Sentindo que a violencia
     Não dobraria o operario
     Um dia tentou o patrao
     Dobra-lo de modo contrario
     De sorte que o foi levando
     Ao alto da construcao
     Enum momento de tempo
     Mostrou-lhe toda a regiao
     E apontando-a ao operario
     Fez-lhe esta declaracao:
     ? Dar-te-ei todo esse poder

     E a sua satisfacao
     Porque a mim me foi entregue
     E dou-o a quem quiser.
     Dou-te tempo de lazer
     Dou-te tempo de mulher
     Portanto, tudo o que ves
     Sera’ teu se me adorares
     E, ainda mais, se abandonares
     O que te faz dizer não.
     Disse e fitou o operario
     Que olhava e refletia
     Mas o que via o operario
     O patrao nunca veria
     O operario via casas
     E dentro das estruturas
     Via coisas, objetos
     Produtos, manufaturas.
     Via tudo o que fazia
     O lucro do seu patrao
     E em cada coisa que via
     Misteriosamente havia
     A marca de sua mao.
     E o operario disse: Não!
     ? Loucura! - gritou o patrao

     Não ves o que te dou eu?
     ? Mentira! - disse o operario

     Não podes dar-me o que e’ memu.
     E um grande silencio fez-se
     Dentro do seu coracao
     Um silencio de martirios
     Um silencio de prisao.
     Um sielncio povoado
     De pedidos de perdao
     Um silencio apavorado
     Com o medo em solidao
     Um silencio de torturas
     E gritos de maldicao
     Um silencio de fraturas
     A se arratarem no chao
     E o operario ouviu a voz
     De todos os seus irmaos
     Os seus irmaos que morreram
     Por outros que viverao
     Uma esperanca sincera
     Cresceu no seu coracao
     E dentro da tarde mansa
     Agigantou-se a razao
     De um homem pobre e esquecido
     Razao porem que fizera
     Em operario construido
     O operario em construcao

Soneto da Fidelidade

     Vinicius de Moraes
     De tudo, ao meu amor serei atento
     Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
     Que mesmo em face do maior encanto
     Dele se encante mais meu pensamento.

     Quero vive-lo em cada vao momento
     E em seu louvor hei de espalhar meu canto
     E rir meu riso e derramar meu pranto
     Ao seu pesar ou seu contentamento.

     E assim, quando mais tarde me procure
     Quem sabe a morte, angustia de quem vive
     Quem sabe a solidao, fim de quem ama

     Eu possa me dizer do amor (que tive):
     Que não seja imortal, posto que e chama
     Mas que seja infinito enquanto dure.