O INÍCIO DO GRUPO E AS VÁRIAS FORMAÇÕES

O Madredeus surgiu em 1987, de uma idéia de Pedro Ayres Magalhães, violonista, e Rodrigo Leão, tecladista, de explorar novas formas musicais que unissem o Portugal antigo com toda a herança musical moderna. A esta idéia juntou-se a de explorar canções cantadas em português, língua que jamais apresentou grande penetração no mercado musical mundial, e que por isso tantas vezes foi esquecida e relegada ao preconceito das rádios e meios de divulgação de Portugal, Brasil e outros países lusófonos. Para isso, colocaram-se os idealizadores a buscar uma voz feminina que pudesse envolver de força as palavras que tinham eles vontade de transsmitir, e audições neste sentido foram feitas com diversas cantoras.

Teresa Salgueiro Um dia, entrando em um café lisboeta, Rodrigo Leão reparou numa jovem que, a pedido de seus amigos de mesa, cantava algumas canções "a capella", sem acompanhamento... e com uma maravilhosa voz, bem ao modo que eles tanto buscavam. Era Teresa Salgueiro que, convidada por Rodrigo Leão, fez uma audição e passou a integrar o grupo. A eles viriam ainda a se juntar o violoncelista Francisco Ribeiro e o acordeonista Gabriel Gomes, compondo assim um grupo de formação talvez única no mundo, que contrapunha um instrumento popular como o acordeão e outro moderno como o sintetizador a intrumentos de tradição erudita como o violoncelo e o violão clássico, emoldurados por uma voz feminina de marcante beleza e presença, ainda sem os estudos que a viriam aveludar no futuro mas já repleta do talento que escola alguma poderia ensinar...

Estava formado o grupo que, ainda sem denominação, juntou-se nas madrugadas da primavera de 1987 de Lisboa, no bairro da MadreDeus, em uma antiga igreja transformada em teatro (nada mais apropriado!) e, entre ensaios e gravações, fez surgir "OS DIAS DA MADREDEUS", álbum assim denominado em homenagem àqueles dias de puro enlevo artístico. Se a qualidade da gravação e a maturidade do grupo deixou alguma mácula neste primeiro álbum, esta não se faz perceber, oculta pelas qualidades artísticas e pela própria essência e entusiasmo do grupo. O nome, Madredeus, nasceu do bairro onde aqueles primeiros encontros, que culminaram no primeiro álbum, aconteceram. O segundo álbum, "EXISTIR", e a gravação ao vivo "LISBOA", a qual reuniu canções dos dois primeiros álbuns gravadas no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, mantiveram a mesma formação do grupo. "EXISTIR", impulsionado pelo sucesso surpreendente de "O PASTOR" e outras canções na Europa, levou-os a excursionar pelo mundo por mais de três anos. Destas viagens surgiu "O ESPÍRITO DA PAZ"e das canções que já haviam sido compostas e não incluídas neste álbum, "AINDA". Nestes dois álbuns, gravados simultaneamente, a formação é alterada: o quinteto transforma-se me sexteto, graças à entrada do violão de José Peixoto. Estes álbuns marcam uma mudança forte nas composições do grupo, sobretuddo em termos temáticos, e levam seus integrantes a excursionar por todo o mundo, incluindo a América Latina e a Ásia.

Teresa Salgueiro na capa da revista portuguesa 'Blitz'(2001). Em 1997, já aos dez anos de carreira, o grupo reúne-se em Veneza, Itália, e grava o mais recente álbum de estúdio, "O PARAÍSO", que surpreende seus fãs e provoca um certo rebuliço entre a crítica e o público: saem o acordeão de Gabriel Gomes, o teclado de Rodrigo Leão e o violoncelo e a voz de Francisco Ribeiro ( vale recordar que é dele a magnífica voz de "O PREGÃO", do álbum "O ESPÍRITO DA PAZ") e entram o baixo acústico do talentoso Fernando Júdice e os sintetizadores de Carlos Maria Trindade (que já substituia, com o louvor da crítica especializada, Rodrigo Leão nas apresentações da turnê de "O ESPÍRITO DA PAZ"). Outra mudança é a composição do álbum: quatorze canções, nenhuma peça instrumental. A muitos espantou a mudança, natural em um grupo que está há tanto tempo trabalhando e excursionando, sobretudo pela saída dos dois instrumentos que, no início, pareciam ser a alma do grupo: o acordeão e o violoncelo. Mas esta polêmica morre ao se ouvira as canções de "O PARAÍSO": belíssimas canções, e mais bela ainda a voz de Teresa Salgueiro, madura e mais segura que nunca. Os arranjos, ainda que diferentes, seguem com a mesma qualidade, e as melodias e letras encantadoras estão ali, igualmente... A gravação do espetáculo realizado no Coliseu do Porto e que viria a ser lançada em álbum duplo em 1998, intitulado "O PORTO", apenas confirma esta impressão. O ano de 2000 assistiu ao lançamento de "ANTOLOGIA", uma coletânea de temas do grupo, desde o primeiro álbum, em celebração aos quatorze anos de carreira - acrescidos de dois temas inéditos: a bossanovista "Oxalá" e "As Brumas do Futuro", canção-tema do filme "Capitães de Abril", estréia na direção da atriz portuguesa Maria de Medeiros. O álbum atingiu o topo das paradas de sucesso portuguesas, fato raro para uma compilação de temas antigos de um grupo musical. Em 2001, o grupo lançou seu mais recente álbum de estúdio, "Movimento", que entusiasmou fãs e críticos em todo o mundo e motivou uma nova turnê que os traria ao Brasil em 2002.

Capa francesa para o álbum 'EUFORIA', misturando a imagem do álbum 'MOVIMENTO' com os casarios típicos da Bélgica, país-sede da Orquestra da Rádio Flemish. O ano de 2002, aliás, ficará marcado na história do grupo como um ano de experimentações, com dois discos surpreendentes: "ELECTRÓNICO", uma coleção de releituras eletrônicas de temas do grupo, feitas por renomados DJs e músicos europeus, e "EUFORIA", um álbum duplo que contou com a participação da Orquestra da Rádio Flemish da Bélgica. Não obstante a polêmica causada por ambos os álbuns junto aos fãs mais fervorosos do grupo, ambos os álbuns foram sucesso de vendas em sua terra natal e amplamente lançados no mercado mundial, motivando a extensão da turnê do álbum "MOVIMENTO" ao longo do ano de 2003. O que se nota, contudo, nesses álbuns experimentais é que a alma musical do grupo permanece ali, intacta, quer seja em meio às distorções da música eletrônica, quer seja sob os floreios de metais, cordas e sopros. É Madredeus, como sempre...e como nunca se ouvira antes.