Ano XV, no. 51, setembro de 2008
SUMÁRIO
Relação de Trabalhos Publicados
Neste número do BHd, além do alentado e altamente qualificado material concernente à demografia histórica, permitimo-nos a publicação de três textos não situados no campo estrito da história demográfica; fazemo-lo porque as proposições que deles constam decorreram, em grande medida, da experiência haurida em nosso campo de especialização. As evidências proporcionadas pelo estudo de nossa formação demo-econômica, aliadas ao conhecimento de elementos do pensamento marxista e da filosofia hegeliana, proporcionaram aos autores de O Capital escravista-mercantil a proposição de um modelo alternativo para explicar nossa formação histórica. Tal modelo teórico assim como os artigos que o afirmam como capaz de superar algumas das mais relevantes limitações dos modelos até agora formulados são oferecidos, pois, aos colegas que se votam ao estudo da demografia histórica, tão-somente como uma alternativa a ser considerada quando se pensa na aludida formação econômica e social do Brasil. A par deste material trazemos, como soe acontecer, a bibliografia pertinente ao espírito que informa esta publicação, pensamos aqui nos resumos, no dossiê, nas notícias de variado conteúdo e no lançamento de novas obras.
PIRES, Julio Manuel & COSTA, Iraci del Nero da. O capital escravista-mercantil: caracterização teórica e causas históricas de sua superação. Publicado originalmente: Estudos Avançados. São Paulo, Universidade de São Paulo - Instituto de Estudos Avançados, 14(38):87-120, jan./abr. 2000.
RESUMO. Buscando enfrentar as contradições encontráveis nos vários modelos explicativos concernentes às sociedades escravistas do Novo Mundo propõe-se a existência de uma específica forma de capital, categoria esta ainda não contemplada pela literatura especializada: a forma escravista-mercantil. Explicitam-se, ademais, suas limitações lógicas e históricas, seus pressupostos, os resultados de sua ação, a sua fórmula e seu funcionamento. Por último, depois de identificar-se, no plano hipotético, as condições necessárias à superação da forma capital escravista-mercantil, são reportadas as causas históricas imediatas das quais resultou, para distintas áreas das Américas, a aludida superação. Para ler o texto integral
SILVA,
Sidney Pereira da. Os Registros de Batismo e a Ilegitimidade entre a População
Escrava de Valença (Província do Rio de Janeiro - 1823-1885).
RESUMO. Os registros paroquiais são de extrema importância para compreensão
da organização das populações, principalmente a escrava. Para este trabalho
temos como referência os assentos de batismo da Paróquia de Nossa Senhora da
Glória de 1823 a 1885 (Valença-RJ). O nosso objetivo é fazer uma leitura
historiográfica a respeito da ilegitimidade, e, em seguida, promover um estudo
desse fenômeno no seio da escravaria de Valença. Para ler o texto integral
ANDRADE,
Rômulo. Escravidão e elementos de História Demográfica em Nossa Senhora da
Conceição do Bananal e seu entorno, Itaguaí (RJ) e em Freguesias selecionadas
de Minas Gerais: 1847-1888. Aceito pela EDUR-Editora da Univ. Fed. Rural do
RJ/Ed.FGV como capítulo da coletânea provisoriamente intitulada Estado,
Sociedade e Idéias no Mundo Luso-Brasileiro: Séculos XVI-XIX.
RESUMO. Dentro dos limites de uma pesquisa em andamento, o texto aborda a
economia e a dinâmica populacional da freguesia de Nossa Senhora da Conceição
do Bananal - a atual Seropédica, onde se localiza a Universidade Federal Rural
do Rio de Janeiro - e seu entorno, Itaguaí, comparando-as a freguesias da Zona
da Mata Mineira. Utilizamos os Relatórios de Presidentes de Província, o
Almanaque Laemmert, os Recenseamentos e os Registros Paroquiais de Batismos e de
Óbitos. O corte temporal - 1847 a 1888 - foi determinado pelo estágio atual do
levantamento das fontes. O objetivo mais amplo do texto é procurar na
documentação uma janela que permita visualizar, além da estatística, a
história do universo escravista de Bananal, assim como suas diferenças e
semelhanças com freguesias de Minas Gerais, acrescentando, dessa forma,
elementos para o debate da escravidão no Brasil Sudeste.
ABSTRACT. Within the confines of an ongoing research project, this work concerns
the economy and population dynamics of the parish of Nossa Senhora da
Conceição do Bananal - known today as Seropédica, location of the Rural
Federal University of Rio de Janeiro - and the surrounding region, Itaguaí,
comparing them to the parishes of the Zona da Mata in Minas Gerais. We utilize
the Provincial President's Reports, the Laemmert Almanac, the Census, and Parish
Birth and Death Records. The time frame - 1847 to 1888 - was determined by the
availability of source data. The broader objective of this text is to search the
documentation for a window with an historical view, beyond the statistical, of
the world of slavery in Bananal, as well as its differences and similarities
with the parishes of Minas Gerais, and thus contribute elements to the debate on
slavery in southeastern Brazil.
JESUS,
Alysson Luiz Freitas de. O Sertão Oitocentista: violência, escravidão e
liberdade no Norte de Minas Gerais - 1830-1888. Belo Horizonte, UFMG -
Universidade Federal de Minas Gerais, Dissertação de Mestrado, 2005, 248 p.
Também publicado como: No sertão das Minas: escravidão, violência e
liberdade (1830-88). São Paulo, Annablume, 2007, 242 p.
RESUMO. O autor trata das relações estabelecidas, sobretudo na vivência
cotidiana, entre escravos, forros e homens livres no sertão norte-mineiro no
século XIX.
SILVA,
Sidney Pereira da. Os registros de batismo e as novas possibilidades
historiográficas. Revista Eletrônica história e-história. Campinas, Unicamp,
21 de jul. de 2008. Disponível em:
http://www.historiahistoria.com.br/materia.cfm?tb=artigos&id=53
RESUMO. Pretendemos nesse texto apresentar um pequeno esboço das várias possibilidades que os registros de batismos apresentam ao oficio do historiador, informações que podem ser utilizadas para elucidar aspectos da instituição escravista como: origem dos escravos, o universo dos ilegítimos, constituição de famílias, enfim, questões que representam caminhos promissores para novas pesquisas.
SILVA,
Sidney Pereira da. As relações sócio-parentais entre escravos: o batismo
de escravos em Valença, província do Rio de Janeiro (1823-1885).
Dissertação de Mestrado - Universidade Severino Sombra, 2005.
RESUMO. Este trabalho foi uma análise das dimensões sociais no relacionamento
de "Compadrio" (adoção de um padrinho) pelos escravos em Valença,
Província do Rio de Janeiro. Este estudo foi feito na linha de História Social
e examinou os arquivos de batismo de escravos da Igreja Católica de 1823 a
1885. Coletamos um total de 3.833 registros de batismos. Nossa intenção foi
aprofundar em aspectos ainda pouco observados na instituição escravista,
particularmente o relacionamento de "compadrio", uma situação
fictícia que configura uma forma de resistência, onde o sacramento do batismo
católico é usado para criar laços de solidariedade e ajuda mútua. Na
elaboração da pesquisa, organizamos uma planilha, para coletarmos todas as
informações possíveis registradas e que poderiam passar despercebidas como:
data do batizado, nome do escravo, idade, sexo, condição jurídica, origem,
nome dos pais, cor, origem, condição jurídica, nome dos padrinhos, condição
jurídica, origem, proprietário dos pais, proprietário dos padrinhos, ofício
do proprietário, pároco, data e local que ocorreu o batizado. Somente a partir
de 1871 os assentos batismais de escravos registram a data de nascimento dos
batizados, pois estava em vigor a Lei do Ventre-Livre, que tornava os registros
com datas obrigatórias. Analisamos dados coletados de 5 livros de registros
batismais assim delimitados: 1º livro - 1823 a 1826; 2º livro - 1831 a 1837;
3º livro - 1845 a 1848; 4º livro - 1859 a 1873; 5º livro - 1873 a 1885. Os
livros encontram-se em bom estado de conservação. Apresentam lacunas de um ano
para outro. Os primeiros assentos trazem poucas informações, porém isso não
foi regra, pois os demais e principalmente a partir de 1871 os mesmos trazem
mais informações como, por exemplo, o local do batizado. Numa revisão
historiográfica, observamos, na análise de historiadores que já abordaram o
tema, que estes observaram que nem todos os padres foram tão sucintos sobre as
características dos escravos, uns informaram até mesmo a cor/ condição do
batizando. Somente nos últimos anos do século XVIII é que os registros
passaram a ser mais completos, trazendo origem e condição dos envolvidos,
certamente conseqüência da maior interferência dos visitadores às paroquiais
locais. Cabe mencionar que, observamos vistos de visitadores nos livros
analisados por nós na Paróquia de Nossa Senhora da Glória. Isso foi uma
constante nos registros.
SILVA, Sidney Pereira da. As relações sócio-parentais entre escravos: o batismo de escravos em Valença, Província do Rio de Janeiro (1823-1885). Rio de Janeiro, Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, vol. 166, n. 428, jul./set. de 2005, p. 9-39.
SILVA,
Sidney Pereira da. História regional: ocupação e formação da Vila de
Valença, Província do Rio de Janeiro (1823). Valença, Revista Saber Digital:
Revista Eletrônica do Centro de Ensino Superior de Valença (CESVA), ano 1, n.
1, mar./ago. de 2008, p. 138-158. Disponível em: www.faa.edu.br/revista/v1_n1_art08.pdf
RESUMO. Mostramos como se deram a ocupação e a formação da elite senhorial
na vila de Valença em 1823, seguindo as antigas estruturas do Brasil Colonial.
A distribuição das sesmarias e dos títulos nobiliárquicos representaram os
primeiros passos para a cristalização do poder que, mais tarde, vai-se
confirmar com a expansão cafeeira, colocando a elite senhorial em destaque no
novo cenário que se apresentava - o Brasil Imperial.
SOUZA, João Paulo A. Entre o Sentido da Colonização e o Arcaísmo como Projeto: a superação de um dilema através do conceito de capital escravista-mercantil. Revista Estudos Econômicos. São Paulo, IPE-USP, 38(1):173-203, jan./mar. 2008.
Texto completo disponível em: http://www.estecon.fea.usp.br/index.php/estecon/article/view/769
RESUMO. Neste artigo, discute-se a proposta de Pires e Costa (1995, 2000)
segundo a qual a economia brasileira no período escravista teria estado sujeita
a uma forma específica do capital: o capital escravista-mercantil. Ela permite
a superação da dicotomia entre o modelo interpretativo do Sentido da
Colonização, proposto originalmente por Caio Prado Júnior, e o modelo do
Arcaísmo como Projeto, proposto por Fragoso e Florentino (2001). O primeiro,
por retratar a sociedade colonial como uma projeção imediata da expansão
comercial européia, tem enfrentado dificuldades em acomodar as recentes
evidências empíricas de que a economia colonial podia apresentar uma relativa
autonomia, realizando acumulação endógena. O segundo, ao tentar de forma
explícita acomodar essas evidências, acaba recusando a existência de um
sentido da colonização tal como originalmente formulado. Para explicitar como
o modelo do capital escravista-mercantil supera esse dilema, apresentamos uma
analogia com o desenvolvimento da teoria do valor de Marx em O Capital.
ABSTRACT. This paper discusses Pires and Costa's (1995, 2000) claim that the
Brazilian economy during the slavery period functioned under the direction of a
specific form of capital, called mercantile slavery capital. Their proposal
allows us to overcome a dichotomy between the traditional interpretive model of
the Meaning of Colonization, originally proposed by Caio Prado Júnior in the
1940's, and the new model of Archaism as a Project, proposed by Fragoso and
Florentino (2001). The former, by depicting the Brazilian colonial society as an
immediate result of the European commercial expansion, has had difficulties in
explaining recent empirical evidence that the colonial economy was relatively
autonomous, being able to carry out endogenous capital accumulation. The latter,
however, in trying to explicitly accommodate this evidence turns out to reject
the original formulation of the Meaning of Colonization as a fundamental
external determination of the colonial economy. In order to make explicit the
way in which the concept of mercantile slavery capital overcomes this dilemma,
we suggest an analogy with the way Marx's theory of value is developed in Capital.
TEIXEIRA, Rodrigo Alves. Capital e colonização: a constituição da periferia do sistema capitalista mundial. Revista Estudos Econômicos. São Paulo, IPE-USP, 36(3):539-591, jul./set. 2006. Texto completo disponível em:
http://www.estecon.fea.usp.br/index.php/estecon/issue/view/46
RESUMO. Este artigo tem dois objetivos. Em primeiro lugar, discutir as linhas
principais da historiografia sobre o período colonial brasileiro, da
perspectiva dos seus fundamentos metodológicos. Esta análise crítica da
historiografia parte de uma leitura de Marx que resgata a herança da dialética
hegeliana na compreensão da concepção marxiana da História. Em segundo
lugar, a partir da defesa de um dos modelos propostos no debate, baseado na
categoria capital escravista-mercantil como uma particular forma do capital que
existiu no período colonial, busca-se avançar na compreensão deste período
argumen-tando que ele faz parte de um processo histórico de consolidação do
capitalismo enquanto um sistema mundial, processo esse que tem o capital como um
sujeito automático. Defendemos que a força da forma capital prescinde da
generalização das relações burguesas "típicas" para todo o globo,
e que o sistema colonial não deve ser interpretado como um outro modo de
produção, nem como sendo apenas uma peça da engrenagem da acumulação
primitiva de capital. O "sentido da colonização" é, portanto, a
constituição da periferia de um sistema capitalista mundial.
ABSTRACT. This paper has two aims. First, to discuss the main theoretical approaches about the Brazilian colonial period, from the perspective of their methodological foundations. This critical analysis of the historiography is based on an interpretation of Marx that recovers the influence of Hegelian dialectic in Marxian view of History. Second, from the defense of one of those models present on the debate, based on the concept of "capital escravista-mercantil" as a particular form of capital which existed during the colonial period, we try to advance on the comprehension of this period arguing that it is part of the historical process of consolidation of the capitalism as a world system, process this which has the capital as an automatic subject. We defend that the force of the capital form doesn't need the generalization of the typical bourgeois relations for the entire globe, and that the colonial system neither should be understood as another mode of production,nor as a mere piece of the primitive accumulation of capital. The "sentido da colonização" is, therefore, the constitution of the periphery of the world capitalist system.
VALENTIN, Agnaldo & MOTTA, José Flávio. Dinamismo econômico e batismos de ingênuos: a libertação do ventre da escrava em Casa Branca e Iguape, província de S. Paulo (1871-1885). Revista Estudos Econômicos. São Paulo, IPE-USP, 38(2):211-34, abr./jun. 2008.
Texto completo disponível em:
http://www.estecon.fea.usp.br/index.php/estecon/article/view/276
RESUMO. Estudamos os batismos de ingênuos registrados nas localidades paulistas
de Iguape e Casa Branca entre 1871 e 1885. Em Iguape, nesse período, houve o
esmorecimento do dinamismo econômico assentado no cultivo de arroz destinado
para o mercado interno. Já Casa Branca achava-se próxima à fronteira da
expansão da lavoura cafeeira na província. Com a ênfase posta na comparação
entre esses dois municípios, com vistas a explorar o condicionamento exercido
por seus díspares panos de fundo econômicos, analisamos as características
dos registros aludidos. Observamos a freqüência dos batizados no tempo, bem
como computamos a distribuição, de acordo com a condição de legitimidade,
das crianças nascidas de mães escravas após a promulgação da Lei do Ventre
Livre. Acompanhamos o comportamento da defasagem temporal entre a data do
nascimento e a do batismo. Avançamos, com fundamento em dois estudos de caso,
um para cada uma das localidades selecionadas, algumas considerações acerca
dos intervalos intergenésicos. Por fim, voltamos nossa atenção para a
condição social de padrinhos e madrinhas. Mostraram-se muito expressivas,
regra geral, as disparidades entre Iguape e Casa Branca.
ABSTRACT. We study the baptisms of ingênuos registered in the localities of
Iguape and Casa Branca, both in the province of São Paulo, in the period
1871-1885. Iguape, in those years, saw a slackening of the economic dynamism
based on rice cultivation for the internal market. Casa Branca, on the other
hand, was near the expansion frontier of coffee culture in the province. We
emphasize the comparison between the characteristics of the registers of
baptisms of ingênuos preserved for those two cities to explore the impact of
their different economic contexts. We observe the frequency in time of the
baptisms of children born of slave mothers after de promulgation of the
Ventre-Livre Law. In addition, we compute the distribution of baptisms according
to legitimacy condition, as well as accompany the behavior of the temporal gap
between the dates of birth and baptism. Two case studies are used for some
additional considerations about intergenesic intervals. Finally, we analyze the
social condition of godfathers and godmothers. As a rule, the disparities
between Iguape and Casa Branca were very significant.
VALENTIN,
Agnaldo & MOTTA, José Flávio & COSTA, Iraci del Nero da. Quando os
deveres eram muitos: distribuição e concentração da riqueza a partir de
inventários post-mortem na presença de casos de riqueza líquida negativa.
Comunicação apresentada no XVI Encontro Nacional de Estudos Populacionais,
Caxambu (MG), 2008.
RESUMO. Analisamos a distribuição e concentração da riqueza concernente a
678 inventários de duas localidades do Vale do Ribeira paulista (Iguape e
Xiririca), abertos entre 1800 e 1880. De início, distinguimos a distribuição
da riqueza bruta (soma de todos os bens e haveres pertencentes ao inventariado)
e da riqueza líquida (riqueza bruta deduzidas as dívidas passivas). Este
segundo padrão realoca a posição de 64% dos patrimônios, destacando-se cerca
de 10% cuja riqueza liquida revelou-se negativa. Utilizando como referência a
atividade econômica vinculada ao inventariado, avaliamos o impacto do uso das
duas medidas na distribuição da riqueza e propomos a utilização de um
índice de Gini que possibilita a incorporação destes valores negativos.
ABSTRACT. We analyze the distribution and concentration of the wealth in 678
inventories of two localities (Iguape and Xiririca) of the Valley of Ribeira,
São Paulo, opened between 1800 and 1880. From beginning, we distinguish the
distribution of the rude wealth (adds of all the goods and to have pertaining to
the inventoried) and of the liquid wealth (rude wealth deduced the passive
debts). This as standard places the position of 64% of the patrimonies, being
distinguished about 10% whose liquid wealth showed negative. Using as reference
the economic activity tied with the inventoried one, we evaluate the impact of
the use of the two measures in the distribution of the wealth and consider the
use of the Gini coefficient that makes possible the incorporation of these
negative values.
Estudos
Afro-Asiáticos - Ano 29 (2007) n. 1-2-3
Dossiê: "Para inglês ver"? Revisitando a lei de 1831.
Apresentação do dossiê elaborada por Beatriz Mamigonian e Keila Grinberg.
No momento em que são celebrados os 200 anos da decisão do parlamento
britânico de abolir o tráfico de escravos, cumpre revisitar o impacto do
abolicionismo no Brasil. De fato, tão logo entrou em vigor em 1808, a decisão
tomada no ano anterior transformou o sentimento crescente de condenação da
escravidão e do tráfico de escravos em uma política pública que guiaria e
justificaria as ações do governo britânico ao longo de todo o século XIX.
Já em 1810, o Tratado de Aliança e Amizade, assinado pelos soberanos da
Grã-Bretanha e de Portugal cobrava a restrição do comércio de escravos
conduzido pelos portugueses, com vistas à sua gradual abolição, em nome da
"humanidade e da justiça". A repressão ao tráfico só foi
regulamentada pela convenção adicional ao tratado de 1815, assinada em 1817,
que criou comissões mistas no Rio de Janeiro e em Freetown, Serra Leoa para
julgamento dos navios suspeitos de burlarem o acordo bilateral, que só permitia
o comércio de escravos entre territórios portugueses e ao sul do Equador. Uma
vez proclamada a independência, seu reconhecimento pela Grã-Bretanha foi
condicionado à assinatura de um novo tratado de abolição do tráfico de
escravos: assinado em 1826, foi ratificado em 13 de março de 1827 e entrou em
vigor três anos depois. Pelo tratado, todo o comércio de escravos em navios
brasileiros seria ilegal e as comissões mistas do Rio de Janeiro e de Freetown
estariam encarregadas de julgar os navios suspeitos e emancipar os africanos
encontrados a bordo daqueles que fossem condenados. A lei de 7 de novembro de
1831, debatida no Parlamento brasileiro desde o primeiro semestre daquele ano
foi uma tentativa da Regência de tomar para o governo brasileiro a
responsabilidade da repressão ao tráfico de escravos e dar às suas
autoridades elementos legais claros para fazê-lo. Havia um forte ressentimento
em relação à interferência britânica nos assuntos nacionais, e em
particular o tráfico de escravos. Ressentimento semelhante era sentido na
França, que nunca concordou em assinar acordos bilaterais e naquele mesmo ano
de 1831 proibiu, por legislação nacional, o tráfico francês. Os legisladores
brasileiros foram ainda mais rígidos com aqueles envolvidos no tráfico de
escravos do que estava inscrito nos acordos bilaterais: de acordo com a lei de
1831, seriam punidos todos que se envolvessem no transporte e na venda de
escravos, desde o dono da embarcação até o comprador dos escravos importados
ilegalmente. Além disto, a lei declarava livres todos os escravos introduzidos
no país a partir daquela data e ainda determinava que fossem reenviados para a
África.
Conhecida como "lei para inglês
ver" como se tivesse sido simples resultado das pressões da Inglaterra
pela interrupção do tráfico atlântico de escravos, a lei de 7/11/1831 passou
para a história como se tivesse sido criada para existir apenas no papel e
nunca ser implementada, e ficou popular justamente por representar a suposta
característica brasileira de promulgar leis para jamais cumpri-las. Durante
muito tempo, a historiografia corroborou esta interpretação, baseando-se no
fato de a lei não ter servido muito à repressão do tráfico, que no fim da
década de 1830 e durante a década de 1840 alcançou volumes de importação
antes inéditos, e por esse motivo ter sido alvo de todo tipo de crítica,
inclusive tentativa de revogação em 1837.
Os estudos incluídos neste dossiê
partem de uma perspectiva diferente: reconhecem que a lei de 1831 teve
interpretações diversas (e controversas) entre as décadas de 1830 e 1880,
buscam mapeá-las e assim trazem contribuições importantes para a
reinterpretação do impacto desta lei sobre as transformações na escravidão
brasileira durante o século XIX. Os artigos de Tâmis Parron e de Elciene
Azevedo apontam, justamente, para dois momentos-chave de debate em torno da lei
de 1831: o primeiro para os primeiros anos após a promulgação da lei, quando
conflitos internos ao governo bloquearam sua efetiva aplicação e aos poucos
conduziram para o consenso sobre sua ineficácia e a conveniência de sua
revogação, e o segundo para o fim da década de 1860 e início da de 1870,
quando advogados como Luiz Gama passaram a invocar em favor de africanos
importados após a proibição do tráfico o direito à liberdade baseado na lei
de 1831. Luiz Gama havia sido amanuense da Secretaria de Polícia de São Paulo
e naquela função tinha colaborado para o processo de emancipação dos
africanos livres na década de 1860, o que provavelmente o inspirou na leitura
"radical" da lei de 1831. A experiência de trabalho e a luta pela
emancipação definitiva dos africanos emancipados durante a repressão ao
tráfico ilegal e postos sob a tutela do governo imperial como "africanos
livres" são discutidos nos textos de Maciel Henrique Silva, Alinnie
Silvestre Moreira e Vinícius Oliveira. Através da ação movida pela africana
livre Cândida para se emancipar definitivamente antes de terminar cumprir os 14
anos de tutela em Recife, Maciel Silva explora o endurecimento do tratamento dos
africanos livres pelo governo, reduzindo suas margens de autonomia e tornando
sua liberdade apenas figura jurídica vazia. Alinnie Moreira investiga a
existência de famílias e o status jurídico ambíguo das crianças dos
africanos livres que viviam e trabalhavam na Fábrica da Pólvora da Estrela, no
Rio de Janeiro. Já Vinícius Oliveira segue a trajetória de africanos trazidos
para o Rio Grande do Sul em um dos últimos desembarques ilegais, em 1851.
Alguns deles foram resgatados e emancipados, vivendo sob tutela como africanos
livres na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, e outros foram mantidos
como escravos, vindo a reclamar o direito à liberdade mais tarde, como foi o
caso de Manoel Congo. Maria Angélica Zubarán e Ricardo Tadeu Caíres Silva,
como Elciene Azevedo, exploram o uso da lei de 1831 nos tribunais no Rio Grande
do Sul, na Bahia e em São Paulo respectivamente, revelando fases distintas da
apropriação da lei por escravos, advogados e juízes e também contextos
próprios em que as autoridades imperiais reconheciam, ou deixavam de reconhecer
a validade da mesma lei.
Os artigos deste dossiê contribuem
para uma análise complexa da atuação do governo brasileiro em suas várias
instâncias, do parlamento e também da justiça no que diz respeito às
interpretações dadas à lei de 1831 ao longo de cinco décadas. Eles sugerem a
existência de uma conexão, ainda inexplorada, entre aqueles que faziam a
leitura "radical" e reivindicavam direito à liberdade para todos os
africanos importados ilegalmente e assim buscavam solapar a escravidão. Acima
de tudo, os artigos enfatizam o protagonismo dos africanos, seja reconhecidos
como africanos livres, seja mantidos em cativeiro ilegal, na busca pelo
reconhecimento do direito à liberdade, sempre associado à importação por
contrabando. O impacto do abolicionismo britânico sobre a desintegração da
escravidão brasileira é inegável, porém a complexidade da questão desafia
leituras simplistas. Este dossiê pretende contribuir para história das
repercussões sociais das medidas de proibição do tráfico e das
redefinições da liberdade (bastante precária) no XIX.
Artigos que integram o dossiê
Política do tráfico negreiro: o Parlamento imperial e a reabertura do comércio de escravos na década de 1830. Tâmis Peixoto Parron.
Uma Africana Livre e a "Corrupção dos Costumes" em Pernambuco (1830-1844). Maciel Henrique Silva.
Os
africanos livres, sua prole e as discussões emancipacionistas: As famílias e a
administração dos descendentes de africanos livres na Fábrica de Pólvora da
Estrela. (Rio de Janeiro, décadas de 1830 a
1860). Alinnie Silvestre Moreira.
Africanos livres no Rio Grande do Sul: escravização e tutela. Vinícius Pereira de Oliveira
Para inglês ver? Os advogados e a lei de 1831. Elciene Azevedo
"Sepultados no Silêncio": A Lei de 1831 e as Ações de Liberdade nas Fronteiras Meridionais do Brasil (1850-1880). Maria Angélica Zubaran
O
resgate da lei de 7 de novembro de 1831 no contexto abolicionista baiano.
Ricardo Tadeu Caíres Silva.
SANTOS, Márcio Achtschin, A Filadélfia não sonhada: escravidão no Mucuri do século XIX. Teófilo Otoni, 2008, 72 p.
APRESENTAÇÃO. Este trabalho é uma tentativa de entender os mecanismos colonizadores e escravistas no leste mineiro, aqui também chamado de Mucuri, no século XIX, suas tensões e arranjos para convivências possíveis. Procura-se, pois, identificar os conflitos, mecanismos de controle e conquistas na relação entre proprietários e cativos na região do leste mineiro. As fontes básicas usadas foram os registros de batismos, óbitos e casamentos de escravos da Paróquia Nossa Senhora da Conceição de Filadélfia, o Censo de 1872, os processos criminais envolvendo escravos e relatórios da Companhia de Mucuri. Contempla-se, assim, a ocupação da região, a vivência escrava incluídos -- aqui a família e o compadrio -- bem como as tensões e adaptações entre as classes sociais presentes na sociedade do século XIX, tensões estas que podiam levar a choques e conflitos, igualmente considerados, não só entre os cativos e seus proprietários, mas também entre os próprios escravos.
SILVA, Cesar Mucio. Processos-crime: escravidão e violência em Botucatu. São Paulo, Alameda Casa Editorial, 2004, 122 p.
RESUMO. A base deste trabalho são processos-crimes de Botucatu referentes ao século XIX. Os réus são escravos ou libertos que praticaram delitos passionais ou que, por motivos aparentemente fúteis, viram-se forçados a defrontar a Justiça e seus procedimentos formais. Além de contemplar as relações entre cativos e homens livres, o autor reflete sobre a realidade histórica local sob o prisma da escravidão como foi praticada no Brasil. Tenha-se presente, por fim, que este livro, dadas pequenas modificações, reproduz a dissertação de mestrado defendida, em 1996, na Faculdade de Ciências e Letras de Assis -- UNESP.
PASSOS
SUBRINHO, Josué Modesto dos (organizador). Os classificados da escravidão.
Aracaju, Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, 2008, 302 p.
APRESENTAÇÃO. Publica-se a transcrição das Listas de Classificação de
Escravos a serem libertados pelo Fundo de Emancipação. São documentos de uma
coleção especial do Acervo Geral do Arquivo Público do Estado de Sergipe.
Trata-se de um conjunto único de informações concernente a boa parte da
população escrava sergipana no crepúsculo da escravidão no Brasil
(1873-1875). Tais dados já foram utilizados por J. M. dos Passos Subrinhos para
o estudo da distribuição da propriedade escrava em Sergipe. Não obstante,
como bem anota esse mesmo autor: "Há outras possibilidades, como os
estudos acerca da constituição das famílias de escravos, das relações entre
escravos e senhores, da circulação dos escravos entre os 'plantéis' de
senhores aparentados, da estrutura da população e outros aspectos de sua
demografia".
Pesquisador:
Sidney Pereira da Silva.
Mestre, Prof. Universitário.
Instituição a que se vincula: Professor do Departamento de História da
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Valença/CESVA/FAA.
E-mail: spdasilva@uol.com.br
Título da pesquisa: Movimento de Entrada e Saída de Pacientes 1882-1897 (Santa
Casa de Misericórdia de Valença).
RESUMO. A pesquisa tem como objetivo analisar o tratamento dado pela Santa Casa
de Misericórdia de Valença à população tanto livre como escrava. Recibos de
tratamento de escravos também serão analisados. Mediante esses documentos
será possível estabelecer um conhecimento mais detalhado da população
estudada.
III
Encuentro Regional de Historia y Ciencias Sociales
I
Encuentro regional de Geohistoria
Rivera- Uruguay- 3-4-5-octubre 2008
Objetivos:
1) Promover la comunicación y difusión de investigaciones, proyectos de
investigación, propuestas de trabajo, prácticas pedagógicas, acciones
culturales, presentación de libros, audiovisuales y otras, con particular
énfasis en aquellos que se refieran a la región de frontera.
2) Generar un intercambio de conocimientos y experiencias entre investigadores y
docentes de la región. Para mais informações
. Para ficha de inscrição
IUSSP International Population Conference
Congrès International de la Population de l'UIESP
The 26th IUSSP International Population Conference website is now open and ready to accept submissions for papers and posters. Please go to http://iussp2009.princeton.edu/ to review the list of sessions and submit abstracts. Submissions can be made in French or in English.
The deadline to submit short and long abstracts is 15 September 2008.
The 26th IUSSP International Population Conference will take place in Marrakech, Morocco from 27 September to 2 October 2009.
IUSSP
Conferences are open to everyone interested in population research. Please check
the Conference website regularly for more information on the Conference at http://iussp.org/marrakech2009/index.php
.
Best regards,
Mary
Ellen Zuppan
Executive Director
Conference secretary
IUSSP/UIESP
3-5 rue Nicolas
75980 Paris cedex 20
France
Tel. +33 (0)1 56 06 22 81
Fax +33 (0)1 56 06 22 04
-- --
Le
site web du XXVIe Congrès International de la Population de l'UIESP est
désormais ouvert pour recevoir vos propositions de communications et de
posters. Veuillez vous rendre sur http://iussp2009.princeton.edu
afin de consulter la liste des séances et soumettre votre résumé. Les
soumissions peuvent être présentées en français ou en anglais.
La date limite pour la soumission des résumés courts et longs est le 15
Septembre 2008.
Le Congrès aura lieu à Marrakech, Maroc du 27 Septembre au 2 Octobre 2009. Les
présentations bénéficieront d’une traduction simultanée en français, en
anglais et pour certaines sessions en arabe.
Les congrès de l’UIESP sont ouverts à toutes les personnes ayant un
intérêt pour la recherche sur la population. Veuillez consulter le site web du
congrès régulièrement pour plus d’informations:
http://iussp.org/marrakech2009/index.php
.
Veuillez agréer mes salutations cordiales.
Mary
Ellen Zuppan
Directrice exécutive
Secrétaire du congrès
IUSSP/UIESP
3-5 rue Nicolas
75980 Paris cedex 20
France
Tel. +33 (0)1 56 06 22 81
Fax +33 (0)1 56 06 22 04
É
com grande satisfação que divulgamos a implantação do módulo "Jornais
Mineiros do Século XIX" no SIA-APM. Mediante este novo serviço são disponibilizadas dezenas de
milhares de páginas de jornais de Minas Gerais referentes ao período 1825-1900.
http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/jornais/search.php
SANKOFA
Com
satisfação noticiamos o lançamento do primeiro número de SANKOFA: Revista de
História da África e Estudos da Diáspora Africana. Disponível no site: http://revistasankofa.googlepages.com
A revista é uma publicação do Núcleo de Estudos de África, Colonialidade e
Cultura Política (Departamento de História - USP).
TERRA BRASÍLICA
HISTÓRIA SOCIAL E ECONÔMICA DE REGIÕES DA AMÉRICA LUSA
http://terrabrasilica.blogspot.com/
Trata-se
de um blog dedicado à reflexão sobre o mundo criado pelos portugueses
na América juntamente, mas sem o assentimento espontâneo, com nativos e
africanos. Reúne historiadores e estudantes ligados à Universidade de
Brasília e interessados na complexa experiência da colonização européia do
período moderno. Os participantes do grupo de pesquisa e visitantes estão
convidados a partilhar comentários sobre obras, sugestões de pesquisa,
impressões de viagens, transcrições de documentos, imagens e tudo o mais que
julgarem relevante para os estudiosos da sociedade colonial portuguesa na
América.
Busca-se, assim, ampliar a comunicação entre os integrantes do grupo Terra
Brasílica e pesquisadores cujos estudos se votam a temas pertinentes ao debate
historiográfico sobre o período colonial. (com base na Apresentação escrita
pela Prof. Dra. Teresa Cristina de Novaes Marques).
OUTROS TRABALHOS INCORPORADOS AO ROL
CORRÊA, Carolina Perpétuo. Porque sou um Chefe de Família e o Senhor da Minha Casa: proprietários de escravos e famílias cativas em Santa Luzia em Minas Gerais, século XIX. Belo Horizonte, UFMG, Dissertação de Mestrado, 2005, 178 p.
OLIVEIRA, Mônica Ribeiro de. Negócios de famílias: mercado, terra e poder na formação da cafeicultura mineira, 1780-1870. Bauru, Edusc / Juiz de Fora, FUNALFA, 2005, 280 p. (Coleção História).