Tambacu, o híbrido que deu certo


Famoso peixe redondo, hoje muito comum e bastante difundido em diversos pesquei-
ros da região sul  e  sudeste, o Tambacu faz parte do cotidiano dos pescadores que frequentam os pesque e pague. Mas de onde veio e como surgiu o Tambacu?A pisci-
cultura brasileira é uma atividade que sofreu um grande impulso nos meados da dé-
cada de 80 e hoje se encontra em franco desenvolvimento. Mas ela não é tão recen-
te assim. Nas décadas de 30 e 40 os primeiros ensaios para o  cultivo  de  espécies
brasileiras começaram a se iniciar.Nesta época, Rodolfo Von Ilhering e outros pes-
quisadores visualizaram o enorme potencial que a  piscicultura  brasileira  poderia
proporcionar. Estudaram muitas espécies e desenvolveram (Von Ilhering) a técnica
mundialmente famosa e amplamente empregada de indução à reprodução através de
injeção de extrato de hipófise.
Seguindo os passos de Von Ilhering, aprimorando e desenvolvendo técnicas, os pes-
quisadores brasileiros continuaram os trabalhos. Nas décadas de 60  e 70  os  Cu-
rimbatás, Pacus e Tambaquis encontravam-se dentro dos laboratórios. os Curimba-
tás renderam resultados surpreendentes, com altas taxas de sobrevivência e ganho
de peso.Os Tambaquis também, mas os Pacus (do Pantanal) tinham e têm um proble- ma: o crescimento em cativeiro é bem lento se  comparado  às  espécies  citadas. O
Tambaqui apresentava altas taxas de conversão alimentar(engorda mais de um qui-
lo por ano). Mas é um peixe originário da bacia amazônica e, portanto, quando che-
ga o inverno, não resiste às baixas temperaturas das regiões sul e sudeste. Foi daí
que os pesquisadores do Cepta - Ibama (Centro Nacional de Pesquisa com Espécies
Nativas) tiveram uma grande idéia. Porquê  não  desenvolver  um  híbrido  entre  o
Tambaqui e o Pacu? De onde surgiu esta idéia? É relativamente simples. O Pacu  é
endêmico da Bacia da Prata e, portanto, resiste às baixas temperaturas dessa  re-
gião. Tem  também um crescimento lento, com baixa taxa de  conversão  alimentar.
O Tambaqui tem  uma taxa de conversão alta, mas não tolera a queda de tempera-
tura no inverno. São peixes  da  mesma  família, portanto, espécies  relativamente
próximas. As principais vantagens que se procurava obter no híbrido  eram  a  de
se ter um  peixe com boa taxa de conversão e que fosse  mais  resistente  ao  frio
das regiões  sul e sudeste. Ou seja, agregar num peixe as  características  deseja-
das de seus pais.
 

Híbrido, todo cuidado é pouco

O resultado da hibridação entre essas duas espécies foi um sucesso. O tambacu já
faz parte do dia-a-dia de pisciculturas e pesque e pague. O híbrido tem um  rápi-
do crescimento, boa taxa de conversão e resistência razoável ao frio. Mas a  pro-
dução de híbridos requer cuidados especiais e deve ser feita sob  rígidos  contro-
les para que não escapem para o ambiente natural. Apesar de existir a ocorrência
de híbridos naturais em peixes, a produção indiscriminada  e  sem  critérios  pode
causar sérios danos a natureza. Um híbrido artificial, solto no ambiente selvagem,
pode se acasalar com uma das espécies parentais e causa um verdadeiro  desastre
ambiental. Ao cruzar com uma espécie parental, o híbrido estará injetando  genes
de outra espécie numa espécie onde eles não existiam, causando uma contaminação
genética. As espécies originais podem, portanto, perder suas características. Não
é o caso do Tambacu. Felizmente demos sorte, ao contrário dos russos que, a  fim
de  obterem um caviar  com  melhor  qualidade, resolveram  produzir  um  híbrido
com as   melhores espécies de Esturjão (Acipenser spp.), o Branco e o Beluga, que produziam o autêntico caviar, o mais caro  do  mundo. O híbrido  foi  obtido  com
sucesso e acabou escapando para seu ambiente  natural. Resultado... não  existiam
mais espécies parentais puras - e já podem ser consideradas  quase  inexistentes.
O brasil, detentor da maior fauna de peixes de água doce do  mundo  que  não  se
empolgue, todo cuidado é pouco, como os próprios russos podem atestar...