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A
evocação
"Não é possível
"medir" a memória; tão somente
podemos avaliá-la de acordo
com o que evocamos dela. Porém há um hiato profundo
entre as memórias e sua evocação ;
diversas evidências indicam que temos muito mais memórias
do que as que conseguimos recordar"[IZQ 92, p. 47] Ao
se defrontar, na rua, com um antigo companheiro da escola, a quem não se tem
visto há décadas, e o reconhece de imediato, apesar de sua calvície, de sua
enorme barba, sua gigantesca barriga e seus
três netos. O reconhece-o
talvez por um mínimo gesto, quase imperceptível, ou por
um detalhe de seu nariz ou de sua forma de caminhar. Por insignificante
que pareça este estímulo,
foi o suficiente para relacioná-lo ao colega de infância e evocar sua
imagem. Todos
sabem também, que se tende a não evocar
experiências ou fatos desagradáveis
ou comprometedores. Não afloram com facilidade à consciência
os detalhes das humilhações que
se tenha padecido. Nem se pode evocar com precisão a sensação de dor
associada a uma experiência: pode-se
recordar as
circunstâncias que envolveram esta
experiência, mas não a dor em si. Tal peculiaridade é benéfica à reprodução
humana, pois se recordassem com exatidão a dor do parto, as mulheres nunca
teriam um segundo filho.[IZQ 92] Pouco
se sabe atualmente sobre a evocação de memórias, bem como de seus mecanismos. Para
António Damásio, a evocação é um processo reconstrutivo, tendo início nos
córtices pré-frontais, que guardariam uma
espécie de mapa para a reconstrução
das memórias. Esse mapa possibilitaria, através das ligações do córtex pré-frontal
com os córtices sensoriais, uma
espécie de recriação do cenário envolvido em determinada memória evocada.
Esta "projeção mental" envolveria
os sistemas sensoriais dos diversos sentidos envolvidos nas memórias (visão,
olfato, audição, estado de corpo...) Nos
modelos de redes neurais, a evocação está incorporada naturalmente, já que certos estímulos aplicados
a uma rede modificam seus
parâmetros, produzindo uma família
de padrões de "comportamento" que
"contém" determinada memória, fruto daqueles estímulos e evocável
por eles. [IZQ 92]
Estados
de ânimo e fatores emocionais estão
fortemente ligados à capacidade de evocação de memórias.
Pacientes deprimidos, por exemplo, costumam sofrer de uma amnésia
passageira, que tende a desaparecer,
sem deixar seqüelas após o
tratamento de sua causa, a depressão. Outro
exemplo é o que os
psicanalistas chamam de "repressão", onde não
se evocam explicitamente memórias de fatos desagradáveis ou
constrangedores. No entanto, mesmo de forma imperceptível ou implícita
estão presentes e contaminam, por associação,
outras memórias. Uma mulher, que na infância tenha sido violentada
por seu pai alcoólatra, poderá quando adulta, sentir profunda aversão
por todos os bêbados ou por
todos os homens maduros, mesmo que
não recorde, conscientemente, o desafortunado episódio com seu pai. Não
se sabe muito sobre
este fenômeno. Mas é evidente que
conexões entre vias e
centros encarregados dos
processo emocionais e vias e
centros próprios da evocação
devem estar envolvidos. Corroboram para esta conclusão as
características funcionais do sistema límbico, onde se processam as
respostas emocionais e boa parte do
mecanismo de consolidação das memórias. |