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   CONCLUSÕES

Conforme foi visto nos capítulos anteriores,  torna-se clara, apesar dos grandes avanços tecnológicos, a   relativa ignorância a respeito dos mecanismos envolvidos  nos processos da memória humana,  tanto a nível neuro-fisiológico como bioquímico.

No entanto, a situação não deve ser considerada desanimadora. A última década  tem sido rotulada  pelos especialistas da mente humana como  a “década do cérebro”.  Novas técnicas de sondagem da atividade cerebral tem aumentado consideravelmente o conhecimento sobre a intrincada maquinaria do cérebro.

Segundo o professor  Izquierdo,  as memórias declarativas, aquelas que interessam aqui,  não são simples ao ponto de constituir um só fato isolado. Todas são complexas no sentido de englobarem  informações de distintas procedências: diversos mecanismos sensoriais, espaciais, emocionais e referentes a um estado interno do organismo (estado de corpo). Há um caráter associativo, do qual as memórias não escapam. A memória implica em uma complexibilidade, uma convergência de diversas fontes, incluindo memórias anteriores com as quais as novas se comparam (reorganização)   a fim de sobrepô-las  ou  adicioná-las.

No cérebro humano não existe o dado seco, isolado. Todos os dados que são conservados  possuem algum significado   cognitivo ou emocional associado.     Apesar da escassez de conhecimento sobre a intrincada engenharia do cérebro humano, este trabalho buscou no conhecimento disponível, principalmente   nas descobertas da última  década, teorias que avancem na compreensão científica e isenta  daquilo que denomina-se inteligência. As pesquisas realizadas  confirmaram a hipótese de  que grande parte da inteligência humana, da  capacidade de enfrentar novas situações  e tomar decisões, está  diretamente relacionada com a forma como o indivíduo armazena seu conhecimento  e  como ele organiza este conhecimento. Isso é essencial para o momento em que este conhecimento é necessário na avaliação de situações novas, na comparação com antigas situações, na imaginação  e simulação mental das  soluções possíveis e na  avaliação dos prováveis desfechos destas soluções. Esse é o processo básico do raciocínio humano.

Na sua vida rotineira, seja ela pessoal ou profissional, o homem não recorre a rigidez da lógica formal  para tomar cada decisão que se apresenta. Recorre  sim  ao conhecimento de suas experiências passadas,  categorizadas segundo suas prioridades.  Este processo de decisão, por vezes é tão automático que a consciência nem se quer toma conhecimento  do seu desenrolar, ela simplesmente é  informada do seu resultado.

Schank e Minsky perceberam essa realidade. Seus  esforços  para transferir  esse modelo para a ciência da computação  originaram os sistemas baseados em conhecimento de especialistas (sistemas especialistas). No entanto,  os modelos  propostos por esses pesquisadores  não incorporavam um importante aspecto envolvido no  processo de decisão humana, a emoção.  Ambos reconheciam que ela estava envolvida, no entanto não sabiam exatamente como.

Foram necessários alguns anos  para que António Damásio formulasse  sua teoria do “marcador-somático”  e trouxesse uma explicação  plausível  para o papel das emoções  no raciocínio humano. As memórias humanas, além de seus atributos  sensoriais  externos, trazem, vinculadas à cada experiência, um atributo emocional. Esse atributo seria uma intensidade ou graduação de sensações definidas como “agradável” ou “desagradável”, “estimulante” ou “ameaçador”.  Estas sensações estão conectadas a cada acontecimento vivenciado e armazenado pelo indivíduo e  são  atribuídas  pelo mesmo mecanismo que, em épocas remotas, auxiliou o homem a livrar-se de seus predadores. Este mecanismo, agora adaptado à vida “civilizada” do homo-sapiens é o marcador-somático.  Esse atributo emocional das memórias humanas é talvez a principal ferramenta de categorização dessas memórias.  Se as características de uma situação nova que se apresenta ao indivíduo  se enquadrarem  em um padrão similar, generalizado de situações  já vivenciadas,   “marcado” com um atributo emocional negativo, automaticamente  a solução ou interpretação dessa nova situação será acompanhada de uma advertência, uma sensação de “aversão”. Caso contrário  virá rotulada com um estímulo.  Assim  toda  base de conhecimento  de um indivíduo é categorizada e organizada  para otimizar o processamento da informação nos sentido de buscar situações “agradáveis” e evitar situações “desagradáveis”. Não existe segredo nisto, este é o motor da teoria da evolução. Nada mais lógico que o homem, no topo da escala evolutiva, faça uso  deste mecanismo em situações mais sofisticadas.                          

É possível levar emoção aos computadores ?

                  “O problema não é saber se máquinas talentosas  podem ter qualquer emoção, mas sim se as máquinas  podem  ser talentosas  sem quaisquer emoções. Creio que assim que dotarmos as máquinas com a capacidade para alterar suas próprias faculdades será preciso oferecer-lhes todos os tipos de experiência e equilíbrios.”[MIN 89, p. 163] 

                  

                   “...  computadores verdadeiramente inteligentes terão que ter emoções. Isto não é impossível ou mesmo difícil de alcançar. Uma vez que entendamos a relação entre pensamentos, emoção e memória, será fácil implementar estas funções no software.”[MINSKY apud SAB 98, p. 4]

                                              

Simplificadamente, pode-se imaginar o corpo humano como um complexo sistema auto-controlado, formado pelos seguintes sub-sistemas:

·        Controle e processamento: cérebro.

·        Sensores : sistemas visual, auditivo, olfativo, tátil, gustativo e todos o outros tecidos providos de terminações nervosas sensoriais que levam estímulos ao cérebro.

·        Atuadores:

Sistema endócrino e peptídico: liberam substâncias químicas como hormônios, transmissores  e moduladores na corrente sanguínea;

Sistema  nervoso autônomo : controle das vísceras;

Sistema nervoso músculo-esquelético: controle voluntário. 

O cérebro, como órgão de controle, também pode ser influenciado por substâncias  químicas  (ex: oxitocina) liberadas na corrente sanguínea por atuadores. [DAM 96].  

Dada a configuração exposta, e caso aceite-se a definição, defendida por Damásio [DAM 96], de que a emoção pode ser definida  como a manifestação de “estados de corpo” induzidos pelo sistema límbico  e o sentimento como a vinculação destes “estados” às  situações motivadoras, teoricamente, seria possível criar tal contexto em um sistema auto-controlado artificial. Como?  Mesclando as propostas  de Schank[SCH 82] e Damásio[DAM 96].

Dado um determinado sistema computacional, dotado de sub-sistemas de controle,  sensores e atuadores. Tal sistema aprenderia através de pontos de  derivação de experiências passadas (vide capítulo memória dinâmica). Caso algum dos índices  acionados nos pontos de derivação levassem a uma solução insatisfatória, poderia ser vinculado a algum mecanismo marcador  (como os somáticos de Damásio)  que acionassem os atuadores desse sistema, para que criassem uma situação “desagradável” ao sistema como um todo. Um exemplo dessa situação poderia ser uma queda no suprimento de corrente elétrica (tal artifício foi usado por Minsky para limitar a atividade de agentes em um sistema distribuído[MIN 89]). Mas isto ainda não seria o suficiente. Seria necessário que o sistema modificasse sua memória, associando aquele estado (registrado pelos sensores) à solução insatisfatória e colocando um índice  que provocasse a reprodução de tal estado “desagradável” assim que a solução insatisfatória  ameaçasse ser escolhida. Desta maneira, a recriação desta lembrança desagradável inibiria uma escolha indevida. Tal sistema deveria ter a capacidade, ainda, de generalizar a partir destas experiências frustrantes, reorganizando suas memórias  para o enquadramento de situações futuras similares.  Por outro lado, se a solução escolhida fosse considerada satisfatória deveria gerar um estado considerado como “agradável” pelo sistema, incentivando o uso  desta escolha para situações futuras similares.  Esses  mecanismos influenciariam uma série de coisas tal como a atribuição de valores a itens adicionados à memória, e suas associações  com coisas “boas” ou “más”, importantes ou não.

Pode-se perguntar como um sistema assim julgaria o grau de satisfação da solução escolhida. A princípio existiriam duas maneiras:

1.      Através do nível de alcance de metas e objetivos previamente estabelecidos. Deve-se lembrar que neste caso, prevendo-se o sucesso do sistema, talvez este atingisse  rapidamente níveis de solução considerados “ótimos”. Assim o sistema também deveria contar com um mecanismo  automático e permanente  de  readequação de metas e objetivos.

2.      Pela interação direta com pessoas, que fariam o papel  de juízes  dos resultados obtidos. Esta interação poderia ser feita ainda através dos meios tradicionais de interfaceamento homem/máquina ou por soluções  mais arrojadas como  as propostas por Rosalind Picard[PIC 97], tal como o reconhecimento  de manifestações emocionais somáticas (expressão facial, entonação da voz, gestos e movimentos, dilatação da pupila, ...).

Seria possível gerar um comportamento similar em um sistema computacional que não possuísse  “corpo”?  Aparentemente não.  Segundo Damásio [DAM 96], o corpo é uma extensão da mente, a maquinaria emocional envolve uma interação corpo-mente intensa.  O corpo humano é formado por uma rede complexa de sensores e atuadores, responsáveis pela criação de diversos estados de corpo associados aos estados emocionais pertinentes. A importância das emoções na cognição  resulta desta intrincada interação.          A noção de corpo deixa clara as fronteiras  com o ambiente. O corpo é a interface da mente com o universo que o cerca. O homem traça sua posição no espaço  tomando seu corpo como ponto de referência.  O cérebro atua no corpo e dele obtém  feedback. Esses talvez sejam os pilares  da subjetividade do “eu”, da autoconsciência.

Essa noção de individualidade é primordial para que o homem possa cumprir sua programação mais instintiva: a auto-preservação. O que Minsky chamou de “proto-especialistas” e Damásio de  “representações dispositivas inatas” são os instintos de auto-preservação. Deles se originam as emoções secundárias, a partir de sobrepostas interações sociais, primeiro na família, depois na escola  e assim por diante. Assim o homem aprende a traçar seus objetivos e rotular situações como boas  ou más.

O ser humano utiliza-se de todos os sentidos disponíveis para construir representações mentais do mundo real, e destas representações deriva, por analogia,  para aprender novos conceitos.  Os bebês, por exemplo são  extremamente sensoriais, seus conceitos são construídos  baseados  em percepções  e seqüências de sensação/ação.  Mas mesmo nesta tenra idade, os cérebros infantis já começam a generalizar, deduzindo  conceitos  dessa sucessão de experiências sensoriais.  

Esse é um grande desafio. Como representar o conhecimento emocional do ser humano?  Como atribuir valor ou peso ao  atributo “emoção” de cada episódio em memória? No homem, este valor é atribuído em relação ao bem-estar do próprio indivíduo, provavelmente calculado com base no sucesso ou insucesso que cada experiência obteve  em relação à suas metas, metas estas que foram evoluindo no decorrer da vida, partindo  das necessidades básicas de sobrevivência, na infância para metas mais sofisticadas, como o reconhecimento social, e foram se sobrepondo  em  camadas, cada qual suportando a seguinte, a partir de repetidas interações sociais.

Num programa sem a noção de autoconsciência ou individualidade, em relação a quais objetivos o valor desse atributo pode ser definido?   Estas respostas são essenciais para que se possa categorizar e indexar uma determinada base de conhecimento, simulando de maneira mais eficiente  a inteligência humana.  Roger Schank, no seu livro Dynamic Memory,  propôs nas suas estruturas de memória um atributo que suportasse o conteúdo “moral”, conclusões pessoais das experiências  e a conseqüente possibilidade de indexação por este conteúdo.  No entanto o autor não especificou  claramente o que seria este conteúdo moral  e nem como o sistema atribuiria este valor.

Uma alternativa para este dilema seria a modelagem de uma mecanismo que avaliasse  a taxa  de sucesso obtida por uma  solução escolhida com base em experiências similares anteriores.  Esta taxa de sucesso deveria ser calculada em relação  aos objetivos do sistema. Assim, as soluções que tiveram mais sucesso deveriam ter prioridade  de indexação no processo de recuperação de experiências anteriores face à uma nova situação análoga.   Esse, aliás, seria um assunto bastante interessante para dar  continuidade  a este trabalho: modelar um mecanismo de heurística que simulasse o “marcador-somático” de Damásio em um sistema  desprovido de “soma” (corpo).

 

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